segunda-feira, 22 de novembro de 2010

No mundo sim, mas em si primeiro

Quando finalmente chegamos à conclusão que a vida é insatisfatória, que as diversões não divertem, que o consumo é uma indução, o entretenimento um entorpecente, os valores falsos e que fomos enganados, é surpreendente a mudança geral na visão de mundo.

Evidente haver um controle nos bastidores da sociedade. É evidente o poderio econômico das associações de mega-empresas de dimensões difíceis de imaginar, capazes de interferir – e mesmo controlar – Estados, mesmo “democráticos”.

As aspas são porque uma democracia só existe se o povo estiver bem instruído, bem informado, bem assistido pelo Estado, o que não é, evidentemente, o nosso caso e o da maioria dos países. As empresas não permitem que se invista na educação, enfim, no povo. E as de mídia controlam a informação, com enorme poder de pressão dentro da sociedade, nas políticas públicas, na criação de leis, na formação de valores, opiniões, desejos (massacre publicitário), no controle da população.

Às vezes surge a necessidade interna de “fazer alguma coisa”, se sentir útil em alguma forma de mudança, pelo menos descarregando a inconformação, no mínimo, para manter a saúde, física ou mental, pra dar sentido à vida. Há muitas maneiras. Consistentes, inconsistentes, neutras, úteis, contraproducentes...

O fato dessa necessidade ser interna, abstrata, já sugere por onde começar o trabalho. Internamente. Em nós mesmos carregamos as falhas, os valores, as disposições e os erros existentes no mundo, na sociedade. Alguém pode se declarar isento dos condicionamentos impostos, da educação castradora, da pressão da publicidade e do consumismo desenfreado, da tendência à competição, de orgulhos e egoísmos? O núcleo familiar já apresenta pressões. Em toda sociedade se cobra a mediocridade, o padrão. A cultura do superficial, do supérfluo, do descartável, da fartura externa e da carência interna, a razão acima do sentimento, da intuição.

O trabalho com o mundo externo precisa de um profundo e sincero trabalho interno, individual, atento, humilde e constante. Com o tempo, naturalmente, quase que sem se perceber, esse trabalho começa a transbordar, e passa a servir ao mundo, na medida da fertilidade da terra em que cai – são sementes que brotam espontaneamente, como conseqüência da seqüência da vida e do trabalho. No meu caso, quando comecei a colocar no trabalho os pensamentos e reflexões, o relacionamento com o mundo passou a ser muito mais intenso e profundo. O estudo se aprofundou e as relações humanas (e reações, também) passaram a trocar muito mais. Ensino e aprendizado se confundem. Você passa a falar com o comportamento, com o sentimento, com o seu ser e com o ser das pessoas. Nem precisa falar muito, as pessoas sentem, entendem, percebem. Os encontros acontecem, sempre que preciso, por qualquer motivo. Muitas vezes, não cabe entender os porquês, mas podemos sentir a existência de “porquês”.

Um revolucionário, um evolucionário, qualquer um desejador de trabalhar por mudanças reais na sociedade e no mundo, precisa começar esse trabalho dentro de si mesmo, se quiser ter consistência nas ações externas. Perseverança, serenidade, convicção e ausência de expectativas. A humildade facilita muito o caminho. Evita a sensação de humilhação e aumenta a capacidade de perceber as coisas. O orgulho, ao contrário, cega, se ofende, fere, desequilibra. Mas é estimulado ao extremo.

Quanto ao que fazer, a vida nos dá os sinais. Se não der, imagino a necessidade da decisão, da vontade. Mas, em geral, não vemos os sinais estão ao nosso lado ou aparecem pela vida. Mas muito cuidado – quando, na procura, há uma vontade enorme de encontrar, acabamos achando onde não há.

Discernimento é trabalho interno a ser desenvolvido em interação constante com o externo.

O mundo só é como é, porque consentimos que seja. Gradualmente percebemos isso, gradualmente as coisas mudam. A satisfação é viver com este sentido, não esperar chegar neste objetivo. Na verdade, o objetivo é o caminho. E a busca é do que podemos levar da vida. Aí, só a intuição pode falar. Podemos melhorar nossos receptores, mas não podemos usar outros que não os nossos. O trabalho interno costuma melhorar muito. Tanto os receptores, quanto os transmissores.

Somos nós, todos, a força dos que nos oprimem, os controladores do mundo, os donos dos impérios. Sem a submissão, não há impérios. Se não posso mudar o mundo, posso mudar minha visão de mundo, meu comportamento, meus valores, meus desejos. E existir é a função. Ser da forma que eu gostaria que todos fossem – ou viver tentando.




25 comentários:

  1. Depois de uns tempos,meu "eu" mudou radicalmente, mudei demais, muitas vezes nao me reconheço, mais nao é por isso que deixo de lutar para continuar sendo como sou, afinal tenho mais do que certeza, que se pelo menos metade da humanidade fosse como eu, como voce Eduardo, como outros aliados, HAHA, a Elite tava FUDIDA, esse seu tópico "No mundo sim, mas em si primeiro", porra me descreve completamente nao ele em si, mais sim paragrafos dele, acabei de ler agora (22/11) 20horas 07minutos
    Grande Abraço irmão ♥

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  2. Muito bom teus textos!!! Você realmente é um desperto.. eu também mudei muito de uns 7.. 8 meses prá cá.. humildade em 1o lugar sempre.. graças a deus.. tive educação das melhores.. tenho uma vida repleta de privilégios.. mas GRAÇAS a deus.. eu não me deixo ganhar pelo ego.. essa palavrinha pequena "ego" pode destruir muitas coisas... GENTE acordem!!! Vamos ser mais amorosos.. equilibrados.. humildes.. somos todos A MESMA RAÇA.. a raça humana.. que de humana ultimamente tá difícil...

    Beijos de sua nova fã.. Andressa.. parabéns pelo seu trabalho! :)

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  3. Poxa, minha alma agora linkou de amores pelo que tu escreveu.Acredito,acredito nisso mesmo.
    bjos

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  4. Me conte o que eu possa vir a contar um dia.^^

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  5. Cara, tô te acompanhando mentalmente! Me identifiquei mto c sua ideologia! Ótimo trabalho!

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  6. Fantástico Eduardo. O trabalho é totalmente interno. Mudemos nós que o mundo muda com a gente.

    Meu pai, há muito tempo, fazia uma analogia do mundo com um videogame. Na época eu não entendia, hoje entendo completamente. Basta querermos desligar esse videogame que passamos a enxergar o mundo real, mas o videogame da "realidade" é tão atraente como o videogame que jogamos em casa, aonde controlamos bonecos virtuais em mundos virtuais.

    O mundo do dinheiro, dos poderosos, dos opressores é esse mesmo mundo virtual, e nosso ego é o jogador que nos controla sem percebermos. Se nos desligarmos desse videogame, passamos a enxergar a realidade que o objetivo é exatamente o caminho. Não é viver assim ou assado, é apenas viver.

    Grande abraço!!

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  7. BRAVO NOVAMENTE.VC É UM MESTRE!OS MESTRES SÃO ASSIM.E TEMOS POUCOS HOJE EM DIA.

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  8. Ótimo texto, além de super bem escrito.
    O último parágrafo é bem forte, concordo plenamente.

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  9. Tu é um guru!!
    Este texto confirma o que eu já sabia que não tinha, mas também não acreditava ser necessário para a mudança (interna e do mundo):
    Perseverança, serenidade, convicção e ausência de expectativas.
    (Ah santa impaciência! Por mim mudava a mim e o mundo na marretada!)
    Você está certo...é que cultivo destas qualidades é tãããooo penoso...mas o resultado taí, em você: sabedoria!
    Abç.

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  10. Não podemos mudar o mundo,mas podemos mudar o nosso jeito de ver ele... e realmente o que interessa para nossas vidas.. to cansado de reclamar da vida , ja sei como eh! já sei como o sistema funciona! ta tudo errado, valores totalmente invertidos!
    mas chega de reclamar do que já existe, se jah sabemos como somos manipulados pelos imperios por traz de toda a merda que é passada para nós!

    por que nao dedicar o nosso tempo a isso!
    ao inves de reclamar apenas...

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  11. Belíssima externalização de um eu profundo e virtuoso!

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  12. Excelente!! Como tá difícil achar gente assim. Que emoção, quando achei o seu blog e seus vídeos. Continuemos assim!!

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  13. Admiro muito seu trabalho.
    Fico muito feliz quando entro em contato com pessoas que são reflexivas, que sabem criticar e que não aceitam o que as "autoridades" dizem.
    A mudança interior é, concerteza, o começo de tudo.
    Parabéns!

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  14. Bastou ser apresentada a um vídeo seu, em uma aula de psicologia social para me identificar muito com suas idéias.

    Penso que o sistema que vivenciamos formata as pessoas com valores e ideais que lhe são pertinentes e que não seja interessante para esse sistema, concordando com você, que as pessoas se sintam SUJEITOS de suas vidas, tornando-as SUJEITADAS. Acredito na capacidade de todo indvíduo, de pensar, buscar e direcionar suas necessidades, mas a constituição que se vive tem tamanho peso que não penso que seja fácil para todas as pessoas iniciar essa "busca" interna pelo seu SUJEITO. Vejo a Autonomia como palavra chave, que juntamente com o pensamento crítico-reflexivo é esquecido pelas escolas e demais instituições(por motivo compreensível), e que muitas vezes impede esse sujeitado de iniciar um movimento interno de mudança e busca pela verdadeira liberdade.

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  15. Parabens pela franqueza e principalmente clareza nas suas palavras. Há realmente uma sinceriade e uma singeleza munida de uma inteligênia peculiar em teus textos, tuas palavras que se assemelham com ações. Vi um video de vc falando no youtube, e acho massa que ainda exista um meio (internet) que por enquanto tah resistindo e nos ensinando, por conta do caos envolvido no mesmo, a criar nosso proprio filtro para a informacao, a nos tornarmos sujeitos críticos de nós mesmos. esse texto foi muito importante pra minha formação enquanto individuo na luta e desejo de passar de objeto a sujeito dentro da existência. Falo, escrevo, pq acho necessario que quem provoca uma catarse dessas, que caiu como uma luva dentro de um processo que vem sendo bastante difícil, precisa saber que deve continuar e assim a mudança vai se nutrindo. Muita paz harmonia, amor, tudo isso com conciencia dos problemas, reais, sociais e existênciais que nos cercam. Abraço grande. Me chamo Thiago Trapo e acho massa que exista um cara como vc, velho. De verdade.

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  16. Esse texto me lembra uma frase de Tolstói: "Todos pensam em mudar o mundo, mas ninguém pensa em mudar a si mesmo." Nunca é tarde para revolucionarmo-nos

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  17. Eduardo, é mto bom ter esse espaço do blog para podermos perceber o qnto todos nós somos parecidos.
    á, os privilégios... no fim das contas tudo volta á discussão dos vícios e das virtudes.
    somos a geração mártire? morremos fazendo o certo?
    o mundo dessas práticas virtuosas suas não pertence ao presente. ou, ao menos, dificilmente compensa o presente.
    todo o esforço nosso, tanto seu, quanto das pessoas que comentaram aki, ás vezes, apresenta-se como uma vontade de redenção. uma vontade de consertar os erros de nossos pais ignorantes.já estamos descendo a montanha russa, sem freios. quem quer parar a brincadeira?
    parece q justificamos nossas negligências na negligência do outro, botando na negligência do outro a culpa por nossa suposta descrença, e conseguinte vida liberalista. em suma, parece q keremos continuar apertando o gatilho suicida o mais rápido q possamos, para q não perceber q estamos a faze-lo.
    quem pode me julgar? quem nega doritos com coca-cola sempre? quem n usa marcas? quem ai n lancha bono, por falta de tempo? quem ai negaria um conveniente remédio pra dor de cabeça antes de uma prova?
    vezes outras, parece tb q tudo na nossa vida, nosso estilo de educação, tranposrte, alimentação, esportes, entretenimento etc., atua como uma esteira contrária àkilo q gostaríamos de alcançar, q é nossa autonomia, como indivíduos. nossa liberdade. nesse ponto, então, pelo menos eu me encontro travado: como eu posso abandonar a manada, sem abandoná-la? como posso eu abandonar minhas necessidadas sexuais, por exemplo? alias, preciso realmente fazer isso?
    é díficil viver sozinho, gente. é dificil escrever pra ning, é dificil se vestir pra ning, é difícil falar só akilo q as pessoas não kererm ouvir.
    só peço ao destino q n tenha me jogado nessa complexidade á toa, e q eu possa ter a humildade, disciplina, e coragem necessárias para perceber q o estilo de vida certo pod realmente provocar verdadeiro incêndios nas velhas estruturas.
    aliás, não só espero, desejo. colabore como
    puder.

    QUESTÃO REFLEXIVA:(eu faço medicina numa federal,meus colegas kerem fazer uma festa de formatura q dispenda dos esforços de cada a quantia de 5000 mil reais, em 6 anos. devo aceitar participar da festa de formatura? devo ser fútil ou excluído?)

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  18. To understand is to transform what is- jiddu krishamurti.

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  19. " A humildade facilita muito o caminho. Evita a sensação de humilhação e aumenta a capacidade de perceber as coisas"
    Genial.
    Quando a gente sabe o que é, o que precisamos mudar e o que já conseguimos alcançar o caminho além de ficar mais fácil, fica muito menos torto...

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  20. "Discernimento é trabalho interno a ser desenvolvido em interação constante com o externo."

    Muito bom, o que falas..Eu sou da seguinte opinião: Assim como há limites pro conhecimento do externo, há limites também para o conhecimento do interno (o tal do auto-conhecimento). Só que é dificil, putz, muuuuito dificil pro bicho-homem aceitar isso..Na nossa arrogância dominadora, achamos que podemos tb controlar os segredos dessa vida e a saber tudinho, tim-tim por tim-tim o que se passa com a gente. Vã ilusão de nós, formiguinhas "metidas a besta", nesse "mundão que num caba mais"..rs..Consultórios, religiões, bola de cristal, cartomantes, gurus que não acabam mais, colunistas do jornal, vamos que vamos atras de tudo isso..Pois a arrogância humana é tb sinal claro de insegurança.

    Eu acho que é o que você fala, Edu: trabalho constante, pra dentro da gente mesmo e com os irmãos que a vida nos coloca no camimho - Leonardo Boff e Krishnamurti falam uma coisa bacana, que não existe uma essência humana, nossa essência enquanto ser humano sai no contato com o outro, é na relação que nos fazemos humanos. É no processo mermo, levantando e caindo, aprendendo e se permitindo, se esvaziando, relaxando.. quando somos "fracos" é que somos fortes. E caminhar é o grande segredo dessa vida, e a humildade, como você traz de forma precisa ao meu ver, é condição fundamental pra nós humanos que, diferentemente dos outros seres viventes, fomos dotados da razão e, se dermos mole, ela se volta contra nós bonito.

    Quem disse que temos que saber quem foi que pintou a zebra de listrado, não é mesmo? E quem disse que temos que saber onde vai dar o rio...O rio pode não ser de um curso só, as vezes pode bifurcar, trifurcar etc_ se estivermos em paz com a gente mesmo, isso já basta..Como dizia Raul, prefiro conhecer bem "a fonte", ainda que seja de noite, e fazer do sonho junto uma realidade possível. Quantos aos sinais é isso aí, estão aí o tempo todo mas nesse corre -corre frenético que trazemos pra dentro da gente, se mal enxergamoos os sinais visíveis o que dirá os outros tantos, não é mermo?! Estamos todos muito ocupados, procurando o trevo de quatro folhas enquanto a "felicidade" tá batendo na porta doida pra entrar..rs

    "..e nas mensagens que nos chegam sem parar, ninguém pode escutar, estão muito ocupados pra pensar.."

    (Sábio Raul)


    um grande abraço!




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  21. É o lance do desapego. Quanto menos levamos na jornada, menos sentimos o peso. Um exemplo bem claro: se eu viajo de mochila e quero levar um monte de coisas que eu acho que vai ser útil e vai me dar conforto, eu vou ter uma triste surpresa, pois isso vai deixar minha caminhada bem mais difícil.

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  22. Show, de texto, como sempre... Lucidez, conhecimento, visão de mundo incrível!!!!!

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  23. Esse trecho que diz " ser da forma que eu gostaria que todos fossem", SENSACIONAL..Venho de um tempo pra cá lendo vários texto seus, Eduardo e vejo que você sempre fala nisso,alertando as pessoas a não querer mudar o mundo e sim seus comportamentos,isso que é importante e é isso que faz a diferença.

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