O governo argentino enviou ao Congresso o projeto de reestatização da YPF, a Petrobrás da Argentina, que foi entregue por Carlos Menem, o FHC de lá, à REPSOL, petroleira privada espanhola, de graça e de bandeja, como foi a Vale do Rio Doce, a Usiminas, a Eletrobrás e todas as regionais, as empresas de telefonia, de água e esgoto e tantas outras. Assisti a leitura do projeto, emocionado e com um nó na garganta, orgulhoso de los hermanos.
Os lucros do petróleo estavam sendo exportados para uma Espanha, em franco naufrágio econômico, ocupada com as convulsões sociais provocadas pela tal austeridade imposta pelos agentes financeiros internacionais, com o sacrifícios de aposentadorias, pensões, empregos, serviços públicos em geral. Como sempre, o povo tem que pagar a conta desses demônios. Na Argentina, agora, 51% da petroleira pertence ao governo federal e 49% são divididos entre as províncias, que são como os nossos estados. (Há um engano aqui: foram reestatizados 51%, divididos entre o governo federal e os estados ou províncias. O resto continua com empresas privadas, que perderam o poder de mando.)
Cristina Kirschner, mulher corajosa, duramente perseguida, difamada e atacada pelo sistema Clarín (o sistema Globo da Argentina), colocou freios na mídia privada com a ley de medios, apesar da gritaria dos comentaristas e jornalistas mercenários de lá (como vemos aqui todos os dias). Aliás, a mídia daqui tá descendo o malho na presidente argentina, de todas as formas. Insinuações, comparações maldosas - Hugo Chávez de saias, disse uma voz suína -, a mesma nojeira de sempre.
E professores, como o coordenador do curso de jornalismo de São Borja, que me fez ouvir pérolas como "os grandes meios são, sim, o sustentáculo da democracia", numa palestra em que eu denunciava o jornalismo mercenário, desonesto, deformador da realidade que essas empresas praticam, aprovam esse jornalismo e o sonho dos alunos em ser parte desses esquemas cruéis e desonestos. Os gritos, assovios e aplausos, depois da minha resposta, o fizeram se retirar do auditório, furioso. Depois, submeteu o vice dele ao vexame de me esculhambar pelo tuíter, apesar do tal vice-coordenador nem ter ido lá, violando princípios jornalísticos e demonstrando que a defesa de interesses está acima da ética, do profissionalismo e até de regras básicas do jornalismo. Professores que encorajam seus alunos a ambicionar um lugar nessas empresas mau-caráter são elementos de manutenção dessa estrutura injusta, perversa, covarde e desumana. Estimulam o conflito e a competitividade egoísta, atiram uns contra os outros e deixam a verdade em segundo plano, pra ser usada apenas quando for conveniente - caso contrário, mente-se, tranqüilamente. O que vale é a grana, a fama, o "sucesso", não importa o custo moral.
Para esses criminosos morais, a Argentina cometeu pecados imperdoáveis. Estabeleceu o controle legal das empresas de comunicação - coisa que aqui não há, ou não funciona - e reestatizou o que as grandes empresas tinham levado de graça, com pagamento em falácias, papéis podres, títulos de dívidas e outras enrolações econômicas. Deles não se pode esperar outra coisa que reações raivosas, histéricas, ameaças e previsões catastróficas. Como aqui. Farinha do mesmo saco, mercenários da palavra, gente sem pátria ou nação em que se integrem, além dos privilégios obtidos na venda das suas consciências, servindo aos poderosos interesses desses menos de 1% que concentram os reais poderes sobre a sociedade, atacando tudo o que serve à coletividade, indiferentes ao sofrimento da maioria e hostis a qualquer tipo de solidariedade sem restrições, a qualquer tipo de sentimento de família humana.
Parabéns aos hermanos argentinos. Que seu exemplo nos sirva.
Está em espanhol e eu não sei colocar legendas.
Reações (20.04.12)
Já era de se esperar as reações indignadas da legião defensora (e regiamente paga pra isso) dos interesses empresariais. Entidades representantes da população européia falam em retaliações e defendem explicitamente os interesses mega-empresariais da multinacional expropriada. Jornalistas e comentaristas do mundo todo caem sobre o assunto com mordacidade, com fúria, ironias e deboches pesados, Cristina La Loca, Hugo Chávez de saias (aproveitando o trabalho midiático bem-sucedido de demonização do presidente venezuelano, apresentado descaradamente como ditador, em contradição com os mais de dez pleitos passados por ele, entre eleições, reeleições, referendos e plebiscitos - pelos mesmos motivos, ou seja, conter as grandes empresas no avanço sobre os direitos das populações e colocar o Estado a serviço do seu povo como um todo) e por aí vai, contando com retaliações contra a Argentina.
A Argentina tem um histórico interessante neste sentido. Até o ano 2000 sua política econômica era apontada como exemplo pro resto da América Latina, privatizando tudo o que era público, desmontando a rede ferroviária, destruindo os direitos trabalhistas, atrelando o país numa dívida externa (que, depois dos processos "globalizantes", mudou o nome pra dívida pública - estratégia marqueteira) e se pondo de joelhos, a pagar juros que só aumentam e uma dívida que não diminui. Então, o país quebrou, o povo foi à miséria generalizada, como era de se esperar, e se levantou, que argentino zangado é brigão, mesmo. Em duas semanas foram derrubados vários presidentes pelo movimento "que se vayan todos" (ver o filme Memória do Saque - Memoria del Saqueo -, de Fernando Solanas, produção franco-suiça-argentina) e foi eleito, pela primeira vez, Néstor Kirshner. Com o povo nas ruas, em levante permanente, as grandes empresas foram acuadas e reduziram seu espaço de manobra, mantendo o poder sobre as comunicações, com a mídia privada já meio desmoralizada - o Clarín é a Globo de lá. E o governo pôde começar a fazer mudanças a favor da população, bem aos poucos. Néstor foi eleito, reeleito e, depois, Cristina Kirshner continuou o processo, firme e feminina, na direção de uma sociedade que não abandone nenhuma parcela da sua população.
Os privilegiados se revoltam, se agitam, a mídia esbraveja, difama, distorce, conclama à revolta e à derrubada da presidente. Mas ela, com movimentos corajosos de mestre, praticamente anula o poder das minorias ricas que controlavam as políticas públicas, a serviço dos exploradores estrangeiros. Investe na tv pública e esta se torna referência para a população, desfazendo as mentiras das tvs privadas, que urram contra o ataque à "liberdade de imprensa", termo sempre usado pela mídia pra defender sua liberdade de mentir sem ser desmentida. Une seu país ao movimento de união dos países latinoamericanos, fortalecendo a resistência aos abusos das grandes multinacionais representadas por seus governos dos países do chamado primeiro mundo - primeiro, claro, às nossas custas históricas. Seus governos melhoram as condições de vida do povo e, enquanto pela mídia privada internacional a presidente Cristina é difamada, o povo argentino a apóia em massa - fórmula infalível para a continuidade do processo.
Eu fico até constrangido com esses pseudo-brasileiros privilegiados da mídia, os tais jornalistas e comentaristas e suas expressões fisionômicas sempre falseadas, aos meus olhos, combatendo os hermanos latinoamericanos, bolivianos, venezuelanos, nicaragüenses, equatorianos, que passam por processos de descolonização política e econômica e levantam sua cabeça diante dos impérios corporativos mundiais. Em sua subalternidade ideológica, cultural, moral e quantas outras abjeções, esses profissionais da mentira e da distorção trabalham para difamar, desvalorizar e ridicularizar os processos de libertação dessas amarras seculares, em favor dos que consideram as divindades do mundo, os donos das corporações estadunidenses e européias, acostumados a escravizar, explorar e saquear povos no mundo inteiro, como que por direito de nascimento, como os reis da antigüidade.
Segue o processo.
Recebi interessante reportagem de Eduardo Febbro, de Paris, em boletim de notícias da Carta Maior, em 20.04.12, nesse link - http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=19996&boletim_id=1172&componente_id=18772
Eduardo, ao ouvir a noticia no BomDiaBrasil, da Globo, e todas as suas criticas, comecei a me perguntar sobre midias alternativas. O segundo lugar que pensei foi o Diarioliberda.org, o segundo foi o observareabsorver.
ResponderExcluirFiquei me questionando sobre um certo teor de desonestidade por parte da Argentina. Mas depois, me questionando sobre formas mais amenas, percebi que nao haveria jogo de cintura: os tais demonios estao ai mesmo, prontos pra sugar.
Então que seja uma atitude drastica mesmo. Melhor que esperar pra morrer como um covarde. Compartilho o pensamento.
Abraços!
A forma como a globo expõe a notícia mostra muito bem o a visão tendenciosa e unilateral que possui, pois apenas refee-se ao fato de que a Argentina estatizou a YPF, que isso abala as relações internacionais, bla bla bla ... em momento algum tenta falar as razões que fizeram o governo argentino tomar tal medida, ou fala sobre o caos que é o fornecimento de combustíveis na Argentina.
ResponderExcluirEduardo, estou lendo o seu livro, parabéns pela belíssima obra!
abraço
Bortolin Furlanetto
Não só a Globo mas os veículos de comunicação escritos como Jornais e Revistas foram totalmente tendenciosos no assunto,infelizmente. A política nacionalista Argentina também é perigosa, existe um certo exagero na forma como estão conduzindo o país,porém neste ponto eles agiram de maneira correta. A revista Veja foi sem dúvidas a mais tendenciosa de todos, uma vergonha, e o pior de tudo é que muita gente toma esses meios de comunicação como únicas formas de verdade,o que é realmente um absurdo. A privatização de empresas em nosso país só foi necessária porque os políticos brasileiros não souberam gerir as empresas, do contrário poderíamos ter a Petrobrás entre as maiores do mundo e sendo 100% brasileira, a também de se concordar que a privatização em alguns aspectos foi positiva, como é o caso da internet e telefonia, isso é, foi e não foi, pois ao mesmo tempo que temos serviços de melhor qualidade como internet,telefone e celular conectados no Brasil todo, pagamos um valores exorbitantes pelo serviços e somos reféns do interesse das multinacionais. Grande abraço Eduardo, sou fã do seu trabalho e costumeiramente acompanho o blog,todo fim de semana entro para ler, quando puder quero comprar o seu livro também.
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