Parados em
Cavalcante, uma cidadezinha ao norte de Goiás, no meio da Chapada dos
Veadeiros, estamos sem poder vender, sem poder fazer eventos e exposições,
gastando o que estávamos juntando na viagem pra chegar de volta em condições de
pagar as despesas, comprar matéria prima – papéis, manta magnética, camisas,
tintas, etc. – e se sustentar pelo tempo em que estivermos produzindo até
juntar mercadoria outra vez. Não havia rolado nem metade da viagem quando a
pandemia foi “decretada” no Brasil, pra nós foi primeiro em Brasília, depois em
Goiás, até pararmos por aqui, a convite de Tiago Gaúcho, pra olharmos os
acontecimentos e como se estavam encaminhando as coisas. Pra tomar pé da
situação real, se informando por meios de comunicação mais confiáveis que a
mídia. Então Palmas desmarcou o evento, dois dias depois o Ceará fechou as
fronteiras e nós até pensamos em voltar pra casa, cruzando todo o estado de
Minas. Mas era o período em que a pandemia tava no tempo de infestação, no
período da contaminação – e aí não dava mais pra não ver, dava pra sentir que a
coisa ia ser uma avalanche, embora não quisesse acreditar. Em cinco adultos e
uma criança, decidimos ficar por aqui. Com uma sensação de apocalipse. Alugamos
um quarto pro mês.
Como recurso
pra bancar as despesas e não acabar a grana toda, Ravi e Satya sugeriram uma
rifa, o que achei uma boa idéia. No momento, é uma forma de fazer frente às
despesas inesperadas sem acabar com a grana toda, sem ficar a perigo geral. As
coisas foram escolhidas hoje, conforme as fotos mostram. Só pra referência:
·
Três camisas, duas de sessenta reais (baby look
G), uma preta de setenta (tamanho a escolher), total R$ 190.
·
Coleção completa do fanzine “Pençá”, dez reais
cada um, total R$ 50.
·
Coleção dos livrinhos feitos à mão, tamanho
cordel, 16 páginas, também dez cada, R$ 50.
·
A trilogia do povo caminhando, a família humana
em direção à tomada de consciência, cada um custa 50 reais, o bondinho também a
50 e o “Loucos” a 60, total, R$ 260.
·
E os ímãs – chamados “de geladeira” – a 4 reais
cada um, são cinco, total R$ 20.
Dez reais cada bilhete da rifa. Serão, ao todo, duzentos bilhetes, vendidos no feicebuque, por mensagem na página
Em 1996, quando eu morava em
Santa Teresa, aprendi com Moisa a trabalhar com malha, fazendo camisetas desde
a modelagem. Então fiz desenhos pra estampar as minhas próprias camisetas,
enquanto trabalhava nas dela, em sociedade. Quando ela resolveu voltar ao
Maranhão, seu lugar de origem, eu já tinha vários desenhos, entre eles essas
pessoas caminhando. A idéia era que a humanidade caminha através do tempo e do
espaço em direção à tomada cada vez maior de consciência. A consciência de que
é uma família planetária, que chegaria junto com a consciência de que há
infinitas famílias planetárias pelo universo afora. Durante anos imprimi e vendi
esse desenho, em camisas e em papel pra emoldurar e “vestir” paredes nuas. Representam
exceções na multidão condicionada, que caminha presa de padrões e valores
comportamentais medíocres e impostos por uma sociedade mediocrizante.
Em 2003, levando em conta que as
exceções chamam a atenção e que consciência contamina, fiz um segundo desenho
sobre o mesmo tema. Mais pessoas caminham em direção à tomada de consciência,
mais pessoas se destacam dos valores vigentes, vendo e sentindo mais por conta
própria do que pelas imposições sociais, pelas lavagens cerebrais da educação,
da cultura, da mídia, do jornalismo distorcedor. Mais gente percebendo a
falsidade das propostas de vida que a sociedade apresenta e tomando iniciativas
“loucas”, na visão convencional. Há mudança de pessoas, mas muitas permanecem.
A lavadeira, com trouxa de roupa na cabeça, foi minha vizinha no Alto de São
Francisco, na Boca do Rio, em Salvador. De mão dada com ela, o neto – ela
cuidava dele enquanto a filha trabalhava fora, num emprego – e o cachorro que
ia sempre com eles, quando ela levava pra entregar e trazia pra lavar mais.
Em 2010, finalmente, resolvi
representar a humanidade como se fosse inteira, pra simbolizar um futuro ainda
distante muitas gerações, num planeta mais evoluído, numa sociedade mais
humana, onde não existam a fome, o abandono, a miséria, gente largada como
lixo. Uma sociedade que priorize o bem estar de todos, incluindo bichos e
plantas, equilíbrio social e ambiental, harmonia planetária. Aí, sim, poderemos
desenvolver estágios superiores de existência. Nesse desenho eu me retratei e a
meu filho Ravi, coloquei o Pepe – meu irmão peruano afro-asiático -, o Gandhi,
numa humilde segunda linha, minha amiga Helena Cristina, com uma mecha branca
no cabelo. A bruxa está nos três desenhos, representando a mística
diferenciada, não convencional e perseguida por séculos de dominação cristã,
com sua sabedoria resistente a toda tentativa de extermínio. Ela está
caminhando voluntariamente – eu digo sempre que ela estava voando na vassoura
que está carregando, viu a multidão e desceu pra participar da caminhada, em
solidariedade humana. Tentei abranger o máximo de tipos humanos que pude me
lembrar, nesse pouco espaço do papel. A intenção é representar a humanidade
como um todo, caminhando junto como família que é.
Essa frase eu encontrei numa
folha de papel de caderno amassada como uma bolinha, no chão de uma padaria de
Salvador, em 83 – se me lembro bem. Brisa já era nascida, Adhara nasceria no
fim do ano. A vontade de colocar no meu trabalho o que eu estava pensando,
vendo e sentindo, da vida e do mundo, se desenvolvia. Descobri nessa época a
gravura em metal, então com ácido nítrico, e comecei a colocar pensamentos,
desenhos, coisas minhas, mais artísticas, no artesanato. Essa foi uma das
primeiras frases. Na padaria, havia começado uma discussão no caixa e eu,
entediado, “isso aí vai demorar...”, procurava com os olhos alguma coisa pra
fazer quando vi a bolinha de papel no chão, perto do meu pé. Peguei e abri, a
folha estava toda escrita com frases. Quando vi a dos loucos, a identidade foi
imediata e inevitável. Fui chamado de louco quando saí do Banco do Brasil; fui
chamado de louco quando pedi desligamento do exército; era chamado de louco
porque passava dias na reserva florestal do Mestre Álvaro sozinho no meio do
mato, ou viajando de carona nas férias, dormindo no chão e me expondo a
“desconfortos”; fui tido como completamente pirado quando larguei a
universidade pra lá e segui em busca sem saber bem do quê, satisfação em viver,
eu dizia. Eu me senti elogiado na frase, identificado. Foi só em 98 que fiz o
primeiro desenho em nanquim pra imprimir na serigrafia, em papel e em tecido.
Naquela folha de caderno cheia de frases, na Bahia, constava o nome de Jean
Paul Sartre como autor. Durante muitos anos vendi com essa autoria, até que, em
Santa Teresa, na primeira década do milênio, um italiano protestou. Não era de
Sarte, mas de Carlo Dozzi, “um italiano como io!” ele enfatizou. Aí tive que
refazer as matrizes, pra corrigir a informação. Na verdade, creio que importa
mesmo a reflexão, o pensamento. A autoria é bom saber, mas não é necessário.
Antenas são importantes, na medida das mensagens. Mas são as mensagens a
essência da comunicação, a antena é apenas a forma da comunicação. Enfim, no
desenho que vai no pacote da rifa tá escrito Carlo Dozzi.
Esse desenho foi feito numa
remessa decorativa, a pedidos insistentes pra que fizesse paisagens do Rio de
Janeiro, que quase não havia no conjunto do trabalho, focado em pensamentos,
reflexões, questionamentos, textos e frases. Encontrei uma foto em preto e
branco, mais de quarenta anos de antiga, e copiei a nanquim. O motorneiro aí
envelheceu dirigindo os bondes do bairro de Santa Teresa e morreu num acidente
há seis ou sete anos atrás, onde morreram várias pessoas e dezenas ficaram
feridas. O bonde perdeu o freio na descida, descarrilhou e bateu num muro de
pedra. Nélson, o motorneiro, sabia que era precisos pular e ficou gritando
praquele monte de estrangeiros pra pular. Os poucos brasileiros pularam, os
gringos não. Nélson ficou tentando fazê-los entender até a batida, esqueceu de
pular. Não resistiu aos ferimentos. Eu já tinha o desenho, havia conferido com
ele mesmo, já mais gordinho, usando suspensórios, bigode já branco, mostrando
pra e perguntando se não era ele. “Ih, rapaz, cê fez essa foto, isso tem mais
de quarenta anos, olha eu magrinho, nem usava suspensório...” ele riu. Hoje, no
total, a foto tem mais de cinqüenta, o desenho tem pouco mais de dez. O bonde
não é mais o mesmo, nem passa nessa altura da avenida Almirante Alexandrino,
espinha dorsal do bairro de Santa Teresa, no Rio de Janeiro.
Pequenos pedaços dos livrinhos feitos à mão, tamanho cordel.
Página central de "O cinco estrelas e a periferia". |
Então, somando
tudo: 190+50+50+260+20 = total geral de R$ 470. A rifa será de dez reais. Tá
incluído o correio pra levar seja onde for, daqui de onde estamos a tarifa é
bem maior pra sul, sudeste e nordeste, onde meu trabalho é mais conhecido.
Serão duzentos números, quem levar leva por dez reais tudo. Pra nós, um recurso
de sobrevivência. Pra quem levar, fartura de textos, informações, pensamentos,
reflexões, desenhos pra decorar as paredes e três camisas - por dez reais.
Caso dê
resultado, faremos outros pacotes – e estamos aceitando sugestões que sejam
apenas isso, sugestões. Exigências vão pra outro departamento, a cesta seção (é
cesta mesmo, não sexta).
Dez reais cada bilhete da rifa. Serão, ao todo, duzentos bilhetes, vendidos no feicebuque, por mensagem na página
Olá, cê ta conseguindo postar pelo Correios ?
ResponderExcluirParabéns, siga em frente !
ResponderExcluirSou de Portugal e ouço as suas reflexões à mais de um ano (é o poder das novas tecnologias). Eu considero você e a Lucia Helena Galvão (cada um com o seu estilo), dois seres humanos iluminados pela humildade, sabedoria e sobretudo pela humanidade. Parabéns pelo seu trabalho.
ResponderExcluirNão tenho face!!Mais queria comprar a rifa como faço? Abraço
ResponderExcluirGostaria de, além da rifa, comprar uma camiseta G Observar Absorver. Daqui de Resende/RJ como faço??
ResponderExcluirNão tenho conta ano Facebook, mas qria participar da rifa.
ResponderExcluirBoa noite, Eduardo.
ResponderExcluirPorque não disponibiliza uma conta pra galera colaborar.só uma sugestão.
Quero a rifa, alem de 3 camisetas, como fazer? Disponibiliza ai um site pra gente poder comprar.
ResponderExcluirDisponibilize uma conta.... Gostaria de contribuir
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirSomente por uma questão de precisão, a frase "Loucos abrem caminhos que mais tarde serão percorridos pelos sábios" foi de autoria do escritor, diplomata e arqueólogo italiano "Carlo Dossi", nome artístico, e não "Carlo Dozzi" (duas letras "s", ao invés de duas letras "z"). O nome dele era "Alberto Carlo Pisani Dossi". A frase original, em italiano, era a seguinte: "I pazzi aprono le vie che poi percorrono i savi".
ResponderExcluirO Carlo Dossi tem muitas frases que nos levam à reflexão. Uma outra frase, de autoria dele, que eu gosto bastante é: "Il genio è una varietà della pazzia", que poderia ser traduzida como: "A genialidade é uma variedade da loucura".
Ola!!Estou encantada com suas reflexões,são incríveis nunca tinha visto nada tão verdadeiro de um modo geral.Te descobrir essa semana através de um áudio que eu Recebir mais no áudio não tinha seu nome.Eu tentei pesquisar até que descobrir seu nome.
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirOlá. Sou de Portugal e venh acompanhando as suas reflexões há um par de anos. A sua simplicidade é contagiante. Gosto muito de reflectir e expandir horozontes e a própria consciência com os seus discursos. Continue a espalhar a sua boa energia e a fazer reflectrir mais é um bom gesto e enorme contributo nesta constante mutação milenar que todos a sua maneira participamos. De momento não tenho como comprar mas gostaria um dia de o fazer. Uma camisa
ResponderExcluirFantástico seria beber uma cerveja e ouvi-lo trocar ideia, mas sei que isso e muitp improvável pois a sua vida é uma correria constante. Quem sabe um dia. Mas até lá enquanto as leis do universo não o tornam favorável vou continuando a escutar a mensagem da antena que você é. Continue o maravilhoso contributo nesta fase da constante mutação milenar que todos fazemos parte. Espero que o mundo recupere logo e que essa pandemia seja ultrapassada e você possa continuar a espalhar a mensagem e fazer reflectir, expondo o seu trabalho dialogando e claro vendendo pra se manter. O caminho é em frente como diz nem esquerda nem direita. Abraço e muita paz.
Vamos em frente, querendo ou não. Quem pode parar a passagem do tempo?
ExcluirNem mais. Para a frente é que fica o caminho querendo ou não nada fica estagnado. Obrigado Eduardo. Paz
ExcluirOlá,cara, gostaria de saber c/ faço p/ comprar a rifa e alguns dos seus trabalhos.Tem c.c.;ag,banco? Abraço!
ResponderExcluirQuando será a proxima rifa??
ResponderExcluirOlá, qd será a proxima rifa??
ResponderExcluirOlá, Eduardo!Eu sou de Fortaleza queria conhecer vcs o hare vc edu... essa galera boa. Qnd vcs vir pra Fortaleza publiquem pfff. Um abraço
ResponderExcluirAvisa quando tiver em São Paulo capital
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