terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Complementando Pinheirinho...


Manifesto e abaixo assinado de juristas dirigido à Organização dos Estados Americanos (OEA)

http://www.conjur.com.br/2012-jan-30/pinheirinho-direito-propriedade-atender-funcao-social#_ftn3_8826

É preciso perdoar a confiança que os juristas têm no sistema. Eles estão enraizados, adequados a uma sociedade à qual não vêem alternativas, a não ser pelos meios do próprio sistema. A meu ver, uma ingenuidade. Mas eu não sou ninguém pra ter crédito como eles. E o que eles estão dizendo é importante demais.

http://www.conjur.com.br/2012-jan-30/pinheirinho-direito-propriedade-atender-funcao-social





O texto abaixo é grande e mostra uma enorme quantidade de crimes cometidos contra a população em Pinheirinho, em relatos recolhidos pela Justiça Global, junto com a Rede de Comunidades, o Movimento Contra a Violência e as Brigadas Populares. No mundo inteiro pessoas se solidarizam com os milhares de pessoas vítimas do ataque insano das forças de segurança, bárbara demonstração - como se não estivesse suficientemente demonstrado - do tipo de sociedade em que vivemos, totalmente dominada pelo poder da grana e desse punhado de seres desumanos que se fantasiam de finezas, ostentam excessos, luxos e desperdícios e desprezam toda a população que constrói, mantém e sustenta a sociedade. A mídia, porta-voz dos vampiros, mente, esconde, deturpa. Vivemos na sociedade da escravidão, da exploração, da mentira, da maldade.


Uma vergonha pra qualquer pessoa que se considere humana, vergonha de participar dessa coletividade, de aceitar e assumir valores, visões, objetivos e comportamentos programados pra manter tudo como está - concentrando riquezas e poderes para poucos, espalhando miséria, ignorância e sonhos de consumos impossíveis para todos. Vencer na vida, subir na vida, obter confortos, garantias e facilidades, cenouras penduradas na vara em frente ao burro para fazê-lo andar, puxando a carroça - os poucos que conseguem alcançar as cenouras não deixam de ser burros também, apesar de se sentir grosseiramente superiores aos demais e reproduzir os sentimentos de desprezo que os desumanos no poder emanam pela humanidade inteira. Na verdade, são esses estúpidos os primeiros a defender o sistema como é. Como os cães em matilha, arreganham os dentes pro lado da maioria e abanam o rabo diante dos vampiros arrogantes, os controladores do mundo. E se esforçam por servir bem aos seus senhores, assumindo seus valores nojentos e nocivos. Através de bancos, multinacionais, mega-empresas, o poder financeiro se instalou no governo do mundo, nas comunicações midiáticas, fazendo da vida geral um inferno, do mundo um campo de guerra, a finalidade da existência apenas consumir, desfrutar egoisticamente, insensível ao sofrimento da maior parte da família humana. E pra isso, foi preciso convencer coletividades inteiras, transformá-las em consumidores, em contribuintes, em competidores permanentes por "um lugar ao sol". 
Até quando permaneceremos dormindo, submissos a sonhos fabricados, induzidos a valores falsos e vivendo uma angústia, ao invés de uma vida? Isso que vivemos coletivamente não pode se chamar plenamente de vida. É uma tremenda sacanagem, uma falsidade, uma desumanidade. 


Esse documento será entregue aos foros internacionais, OEA, ONU e onde mais puder. Sem poder de interferência, ao menos se pode trazer à consciência coletiva, como um despertador pra realidade. Esse é o mundo em que vivemos. Essa é a sociedade que nós constituímos. Apesar do ódio, do rancor e do apoio a estas ações, por parte de alguns, da indiferença de tantos e do sentimento de impotência de outros, ninguém está isento de responsabilidade, assumindo ou não. Todos somos parte dessa família universal e negar apenas demonstra o grau de primitivismo espiritual, de grosseria e inconsciência. As raízes dessa estrutura social foram plantadas no inconsciente coletivo e ela, a estrutura troncha da sociedade, se mantém pelos valores e comportamentos condicionados, competitivos e consumistas que se exercem diariamente. Depende de cada um e de todos mudar isso. 


É só clicar nesse link aí. É de revirar o estômago.
http://global.org.br/wp-content/uploads/2012/01/Pinheirinho-um-Relato-Preliminar-da-Viol%C3%AAncia-Institucional.pdf


A ação do Estado
O que restou das casas
Bala de borracha
O abandono



Ora bolas, tô cansado desses caras que denunciam passando manteiga. Violação dos direitos humanos... pf. Crimes contra a humanidade. Esses caras (governantes, comandantes e magistrados que ordenam tais ações) são criminosos desumanos, tinham que estar em cana, sendo estudados pra ver como se produzem tais aberrações em nossa sociedade. Filhos da puta, isso sim, jamais poderiam chegar perto de cargos públicos. Não alcançaram o patamar que mereça o nome de humano, e comandam o aparato público de maneira assassina, a favor de uma classezinha de merda que depende inteiramente dos pobres, de serviçais, da exploração e da espoliação das coletividades. Não perdem por esperar, monstros! A humanidade começa a acordar, em meio aos narcóticos de consciência espalhados no varejo. Apesar deles. Chegará o dia em que não haverá um único pobre disposto a serví-los e vocês terão que aprender a limpar sua própria sujeira. Ah, seres desumanos, aboletados na sua falsa fineza, numa superioridade construída em cima de mentiras, controles e induções. Sua hora há de chegar, já desponta no horizonte, já há os que enxergam e a consciência é como uma peste contagiosa que se espalha sem freio. Nada pode deter o curso da história. Não a história de uma vida ou de uma geração, mas a história da humanidade que segue, no dia a dia, pelos séculos afora, em busca de harmonia. 




Olha aí quem manda... e os fantoches políticos servem. Deixemos de ingenuidade. Essa democracia é uma farsa. Nunca houve democracia. Não sabemos o que é uma democracia, nunca vimos uma. O que conhecemos é a truculência do Estado contra os pobres e seu favorecimento aos ricos. Sem falar nas classes médias, exploradas, mediocrizadas e amedrontadas, sob a pressão e a ameaça da queda no padrão de vida - as mais altas -, da pobreza - as mais baixas -, enquanto a pobreza é ameaçada com a miséria. Nessas classes estão o maior número de consumidores de anti-depressivos.O Estado foi seqüestrado pelo poder econômico e, agora, manietado, manipulado, age criminosamente contra o povo brasileiro como um todo. São os mais pobres os que levantam os tijolos, fazem as ruas, põem o asfalto, os postes, os fios, as tubulações, fazem a conservação, a manutenção, consertam os vazamentos, desentopem os esgotos, carregam as caixas, atendem nos balcões, abrem as portas, fazem a faxina, a comida, tiram o lixo, cuidam das crianças, lavam roupas, carros, prédios, fazem entregas, consertam o que estraga, pagam proporcionalmente mais impostos, ou seja, além de construírem, mantêm funcionando e ainda sustentam a sociedade via impostos. Basta dar uma estudada no sistema tributário e isso fica claro. E são explorados, sabotados em educação, saúde, na vida em geral, idiotizados por uma mídia maléfica, entorpecente, deformadora da realidade, são desprezados, iludidos, reprimidos, perseguidos, marginalizados e excluídos dos benefícios da tecnologia. Eventualmente, são massacrados, quando ocupam, como em Pinheirinho, espaços falcatruescos, que não pagam impostos, que não se sabe como chegaram à propriedade de bandidos como Naji Nahas, abandonados há anos, ocupados pela população que não vê o Estado cumprir sua constituição na garantia de moradias e condições de vida digna e toma suas atitudes na resolução dos problemas básicos. Há oito anos esse espaço foi ocupado, virou um bairro. A legislação prevê esse direito, mas o controle da coisa pública pela privada move o aparelho público contra o público. E temos que ver a polícia ser inimiga da população, atacando de forma bárbara velhos, mulheres, crianças, famílias em pânico, dispersadas, membros assassinados ou desaparecidos. O aparato do Estado atirado contra sua população mais fragilizada, mais explorada, mais enganada e sabotada, embora seja a mais imprescindível ao funcionamento do todo. Não há muito o que dizer. Tá na cara, não vê quem não quer.

sábado, 28 de janeiro de 2012

Mudar por dentro, pra mudar a sociedade

Consentimos nessa barbárie social, assumindo os valores incutidos em nosso inconsciente, acreditando na realidade distorcida que nos é apresentada, desejando o que nos é condicionado desejar e nos comportando, mais ou menos explicitamente, como programado nos laboratórios de psicologia cooptada pelo poder econômico e implantado pela mídia comercial. O verdadeiro trabalho revolucionário começa dentro de si mesmo, em cada um. Quem não se dispõe a isso, por orgulho ou outra cegueira, jamais será realmente revolucionário, ao contrário, servirá inconsciente à formação de um cenário de falsa democracia e, no máximo, justificará o incremento das forças de segurança destinadas à contenção de massa, com sua atuação dezarrazoada, virulenta, esporrenta, agressiva, usando a maneira programada de protesto previsível e desejável aos poderosos do sistema. Não é preciso derrubar os opressores, apenas deixar de sustentá-los, de colaborar com eles, consciente ou inconscientemente. E eles cairão, por desamparo. 

Li no Correio do Brasil que a relatora especial da ONU sobre o direito à moradia adequada “pediu” às autoridades brasileiras pra encontrar uma “solução pacífica” e se declarou “chocada” com o “uso excessivo da força” na desocupação de Pinheirinho. Daqui da minha insignificância, eu perguntaria à doutora Raquel em que mundo ela vive. Então não é um procedimento comum e freqüente, as forças de segurança serem atiradas pra cima do povo pobre que toma atitudes de emergência por sua conta, ocupando o que é do seu direito moral ou reivindicando do Estado o que é de sua obrigação constitucional e não é cumprido, porque o poder econômico/político não permite? Porta-voz do sistema, a mídia late furiosa e histérica contra qualquer movimento realmente popular, que tenha expressão e conseqüência, como o dos sem terra, dos sem teto, dos trabalhadores desempregados, o pela reforma agrária, o dos atingidos por barragens, o dos povos indígenas que insistem em sobreviver ao genocídio e ao saque secular das suas terras e tantos outros.

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A relatora especial das Nações Unidas sobre o direito à moradia adequada, a urbanista brasileira Raquel Rolnik diz que esta chocada com o uso da força


As pessoas sem teto sabem muito bem que, ao ocuparem prédios abandonados, correm muito menos risco de violência se forem imóveis públicos. Quando são propriedade privada, mesmo caindo aos pedaços, a desocupação pela polícia é violenta ao extremo, porque a influência raivosa dos proprietários contamina o aparato público de repressão e, como vi no documentário “Atrás da porta” (http://www.youtube.com/watch?v=NDQuRhsr8HI), no aviso de um sargento pras pessoas que se dispunham a sair, “não sai agora não, que a ordem é esculachar”, ou seja, descer a porrada. O traço de humanidade revelado pelo sargento é exceção à regra, mas revelador da disposição do comando em dar o exemplo de terror pros desabrigados, sinal de sujeição ao poder econômico. A propriedade privada é mais sagrada que o ser humano, desde que este seja parte da maioria pobre. A vida que tem valor é a de quem tem patrimônio, tanto mais valor quanto maior o patrimônio. A quem serve o comando das forças de segurança? Pelos fatos, evidentemente, aos que mandam, os grandes empresários, que os revolucionários acadêmicos chamam obscuramente de “o capital”.

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Um punhado de indivíduos cercados de empregados por todos os lados, que não sabem nem lavar suas cuecas e calcinhas, não sabem fazer nada além de ordenar, sabotar, controlar e explorar pobres. Eles morreriam à míngua se não tivessem quem os servisse. Ou teriam que aprender o serviço dos seus empregados, idéia inconcebível pra eles. Não é à toa que o ensino é sabotado (longe de ser por incompetência dos políticos), que a mídia é privada e qualquer tentativa de regulação das comunicações é violentamente rejeitada como ataque à liberdade de imprensa (liberdade pra mentir impunemente, na verdade) e qualquer proposta de democratização, liberando rádios e TVs comunitárias, sindicais, de associações, bairros, municípios e escolas é combatida. É preciso - e fundamental - que o povo seja ignorante, desinformado e mero expectador não atuante em sua própria história, para se manter tudo como está, o poder concentrado na mão desse punhado, dessa corja desumana que se acha superior.

São incontáveis os massacres, as perseguições, as agressões das forças de segurança pra cima da população mais pobre e sabotada em seus direitos constitucionais. Seria exaustivo aqui listar as violências, as ilegalidades, as agressões a movimentos sociais, as falácias jurídicas aplicadas às coletividades, as prisões e assassinatos de lideranças, mesmo depois da ditadura explícita, mesmo a contar do Eldorado dos Carajás, na época do lesa-pátria FHC. Quem vive em comunidade pobre conhece a violência cotidiana, vive sob essa realidade. É muito difícil encontrar nessas comunidades quem já não tenha sido de alguma forma desrespeitado por elementos das forças policiais, quem não tenha parentes, amigos e conhecidos agredidos ou mortos por essas forças “públicas”. A coisa pública está imersa na privada e a seu serviço, enquanto sustenta a hipocrisia de que é um estado democrático, falácia vergonhosa que não se sustenta em qualquer análise isenta e interessada na realidade.

Desgraçadamente, isso não parou aí, mas sim foi estabelecido como comportamento padrão. As forças armadas contra o povo, a favor dos grandes empresários e das classes mais ricas, minorias numericamente insignificantes que se consideram civilizadas, educadas, superiores, finas, o que demonstra sua inferioridade espiritual e disfarça sua fraqueza pessoal. Morrem de medo que a população acorde e faça com eles o que eles fariam com quem os tratasse da forma que a maioria é tratada. Como disse Josué de Castro, o mundo está dividido entre os que não dormem porque têm fome e os que não dormem com medo da revolta dos que têm fome. Os poderosos, com o poder usurpado sobre as sociedades, se armam com forças de segurança pública e privada, do mesmo jeito que dispõem das verbas públicas, do orçamento público, dos organismos públicos, do poder público, como um direito adquirido às custas da inconsciência da maioria, da engabelação e da sabotagem.

Insisto em que todos nós não só colaboramos, como sustentamos esse sistema espúrio, com nossos valores, nossos comportamentos induzidos a partir da infância pelos costumes arraigados desde os tempos do “sangue azul” e atualizados pelo poder de persuasão dos chamados “grandes meios de comunicação”, a mídia privada, e seus profissionais de psicologia do inconsciente e do comportamento. Veja “O século do eu”, ou “O século do ego” (http://www.youtube.com/watch?v=MTKFVFjUr8c), acho que são duas versões do mesmo filme, que demonstra como começou a manipulação do comportamento através do inconsciente, com os conhecimentos desenvolvidos por Freud e aplicados em publicidade por um sobrinho seu, que ficou rico nos USA, servindo às corporações em seu começo de manipulação midiática. De lá pra cá, essa prática foi desenvolvida ao extremo e nos pega a todos desprevenidos. Pensamos que formamos nossos valores, nossos padrões de comportamentos, e somos induzidos todo o tempo. Senão, como aceitar a miséria como inevitável? Como encarar a sociedade como um campo de batalha, como desejar consumos excessivos, como valorizar a forma e desprezar o conteúdo? Um pilantra bem vestido é socialmente bem tratado, uma pessoa honesta, generosa e solidária, se estiver maltrapilha, é invariavelmente maltratada. Não se olha nos olhos, não se leva em conta a alma. 

Ou retomamos o direito - e a obrigação - de formar nossos valores e padrões de comportamento, ou qualquer mudança social será cosmética, sem profundidade e inócua.


Eu gostaria muito de ver as fotos que esse cara conseguiu. Devem ter ficado o máximo.

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Pinheirinho - exposição de um sistema social

Qual é a surpresa? Indignação, sim. Tristeza imensa. Mais uma demonstração do que é a nossa sociedade. A propriedade vale mais do que a vida. A corja dominante impõe seus interesses à esmagadora maioria. Os sinais estão em toda parte. E nós concordamos com isso e sustentamos o sistema. Com valores, pensamentos e comportamentos, sustentamos o sistema. É hora de acordar. Não há surpresa no que aconteceu em Pinheirinho. Apenas as cifras, os números. Eram seis mil pessoas. Mas isso acontece cotidianamente com a maioria esmagadora da população, desprezada, sabotada e reprimida pelas forças de segurança. Desatendida pelo sistema de saúde. Sem acesso a uma educação que mereça o nome. Maltratada no sistema de transportes. Desinformada, condicionada e narcotizada por uma mídia avassaladora. Explorada até o talo no mercado de trabalho. Diluído no tempo e no espaço, é isso o que acontece. Todo dia. Em toda parte. O tempo todo. Muito sofrimento acontecendo, todo o tempo. Em nome do lucro.

Um descaramento crescente. Deve ser confiança na ignorância plantada e nos condicionamentos da mídia, com o controle das comunicações.

Luzes estão se acendendo, há um despertar em curso. Conscientizai-vos uns aos outros. E, sobretudo, conscientizai-vos a vós mesmos. Em valores e comportamentos. Com humildade.






Wernner Lucas saiu de Minas e foi lá ver. Pra alguns, o relato pode ser estarrecedor. Aqueles que acreditam que vivem numa sociedade minimamente justa, onde os poderes constituídos existem para fazer garantir a harmonia social, o bem estar de todos, vão se horrorizar ou não acreditar. Quem está nessa luta, quem nasceu nas classes baixas, quem olha com sinceridade pra realidade, não se surpreende com essa ação do aparelho público contra o público. Revolta, sim, tristeza, sim, mas não surpresa. A situação é essa mesmo. Mudar isso requer mudanças completas. Quem não quer se modificar, que não se habilite à luta e viva sua vidinha frustrante, do nascimento à morte sem nenhum significado, em pleno vazio existencial, a não ser aparentemente, ostentando formas sem conteúdo. Taí o texto, é só clicar no link. Quem quiser emagrecer, leia antes das refeições.

http://wernnerlucas.blogspot.com/2012/01/o-que-vi-em-pinheirinho.html


A Galícia, se não me engano, é uma parte da Espanha em que o povo não se reconhece espanhol. Sua língua é o português, e esse jornal noticiou Pinheirinhos em detalhes.

http://www.diarioliberdade.org/index.php?option=com_content&view=article&id=23644:acompanhamos-jornada-de-luta-policia-militar-ignora-sentenca-e-promove-massacre-no-pinheirinho&catid=257:repressom-e-direitos-humanos&Itemid=131

No vídeo abaixo, a denúncia e a indignação do cineasta, o militante que envolve completamente seu sentimento naquilo que está vivendo, no seu trabalho de ser humano em uma sociedade torta.

sábado, 21 de janeiro de 2012

explicação a uma consulta





Cabeça de Fósforo - óleo sobre tela, 55x46cm, 1999

Foi dada uma pequena garibada no texto original.


Olha só.

Aquela pintura foi feita e vendida em 2001, num boteco na frente da minha casa, pra um camarada que bebia comigo, ex-preso político e exilado, que se encantou com a proposta do quadro. Eu falei com ele que cruzara um "gravata", na Rio Branco (centro superlotado do Rio, cheio de "gravatas" e "taileurs"), que saía de um prédio pra calçada lotada onde eu caminhava e se jogou pra cima de mim, confiando que eu sairia da frente, por um sentimento de superioridade dele, imagino, dentro do seu paletó caro, enquanto eu vinha de cabelo comprido, roupa "largada" e mochila nas costas. Eu vi que ele havia me visto de dentro do prédio ainda, em rota de colisão, e não desviou. Eu desviaria dele, mas a mochila estava com uns 40 quilos, pesada demais pra desviar rápido, não dava, eu apenas travei os músculos e esperei a porrada. O cara foi ao chão e se levantou revoltado. Insultou minha ancestralidade, meu aspecto, minha falta de senso em passar na frente dele ("...fica no meio do caminho!!"), até minha higiene pessoal o cara desqualificou, enquanto eu apenas o olhava - imaginando seus batimentos cardíacos, a angústia da sua vida estampada no descontrole, no estado de nervos. Sem responder, apenas atento à possibilidade de agressão física, que não aconteceu. Ele cansou de berrar sem ter retorno e tomou destino; eu fiquei olhando ele ir embora, quando meu olhar cruzou com o do jornaleiro da banca ao lado, que tinha vindo de dentro pra ver o que acontecia e estava com um meio sorriso - talvez pela minha reação tranqüila, enquanto ele esperava um tumulto. No encontro dos olhares, ele sorriu e comentou, "cabeça quente, hein?" Eu respondi "uma hora dessa tem um AVC, fica todo torto e vai ter o resto da vida pra ficar pensando que era melhor não ser tão nervosinho. Cabeça de fósforo!" Ele deu uma gargalhada e voltou pra dentro da banca, falando sozinho, "cabeça de fósforo". Eu saí dali pensando na imagem de um cara de paletó e gravata com cabeça de fósforo. De noite, no bar, comentei com o camarada o acontecido e completei, "tô pensando em fazer um quadro assim..." e expliquei a idéia da pintura. Ele, na hora, bateu com a mão no balcão e disse "um quadro desse eu compro". "Compra porra nenhuma, papo de boteco, tu tá é bêbado" e ele garantiu que não, que compraria mesmo. “Tô bêbado mas sei o que tô falando, caralho”, se ofendendo por eu não acreditar. No dia seguinte, tela esboçada em carvão, levei ao bar pro cara ver. Ele quis já comprar em preto e branco, no esboço mesmo, mas eu não deixei, pintei o quadro em uns dois ou três dias e ele comprou mesmo. Em duas vezes, e pagou a conta do dia e a do dia da entrega, também. Amarradão.

Quem quiser um cabeça de fósforo vai ter que encomendar e nunca vai sair um igual ao outro. E olha que não gosto de usar essa palavra, "nunca". Mas não sai, nesse caso se aplica, a não ser que se recorra a uma copiadora. As cópias serão iguais entre si, embora não sejam como o original. E os originais são o que o nome diz, mesmo - originais. Na imagem que acompanha este texto, por exemplo, o primeiro dos "cabeças", sinto falta de mais gente na rua. E de um estilo mais impressionista, mais tinta e menos exatidão. Veremos como sai o próximo, já encomendado. Quando terminar, ponho aqui, como acréscimo à postagem. A não ser que a Flávia peça pra não colocar.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

TEDxDaLuz - Eduardo Marinho - O que a razão não alcança

Magnus e as mangas - na beira da Rio-Santos -

     “Minha avó era analfabeta”, disse Magnus, explicando a perda das terras. Ela havia nascido ali, o pai fora escravo e recebeu aquelas terras do ex-dono, com a permissão de ficar ali com sua família e suas tradições. Os filhos cresceram analfabetos, todos, acostumados com o trato da terra, dos plantios e das criações. E fizeram, por sua vez, suas famílias, partiram uns, ficaram outros. Não havia escolas, muito menos para negros.  Só os netos puderam ir à escola, mesmo assim de péssima qualidade.
     Um dia chegaram caminhões e máquinas, cortaram a terra com uma estrada, derrubaram árvores e outras plantas, avisaram a avó que a área tinha dono, uma empresa construtora. “Ela era analfabeta, não sabia se defender”. E assim, o poder da empresa se impôs e a terra foi reduzida. E seria mais ainda, se filhos e netos não se unissem na defesa do que sobrou, um oásis de árvores e algumas poucas casas em meio à devastação causada pela construção da estrada, por um lado, e pelo trevo rodoviário que foi construído sobre um brejo, do outro lado, quase encostando nas casas, e que destruiu um pequeno rio “que dava até jacaré”. O último jacaré apareceu depois da construção do trevo, perdido, e foi levado pra um zoológico.
     Quando vimos aquele oásis, da estrada por onde vínhamos sob um sol de arrebentar os miolos, parecia mesmo um foco de resistência contra o deserto de capim, terra, poeira e pedras que o circundava. Paramos pra pedir água e conhecemos Magnus. Ele nos contou a história.
     Homens da prefeitura estiveram ali várias vezes, pressionaram, ameaçaram com a perda da terra, levaram a família pra conhecer o lugar pra onde queriam que fossem, um apartamento em Campo Grande, num desses bairros "populares" infernais. De longe, os prédios parecem arrumadinhos, coloridos e geometricamente arrumados. De perto, são cubículos onde se apertam as famílias, coladas umas às outras por paredes finas, com problemas de água e esgoto, falta de transportes, de escolas, de postos de saúde e comércio, enfim, o abandono que é oferecido invariavelmente pelo Estado à população mais pobre. Como ficar num lugar desse? Sem espaço, sem quintal, sem árvores, ventos ou passarinhos, “a vó ia ser a primeira a morrer, de tristeza”. Fincaram pé e não saíram.
     O administrador regional veio em pessoa, com o aparato de intimidação costumeiro, cheio de arrogância, exigindo, ameaçando. “Minha tia chamou ele de safado e botou pra correr. Ele foi embora zangado, cheio de ameaças...”
     Depois começaram a derrubar árvores. Chegavam na caminhonete da prefeitura, com motosserras, cortavam e iam embora. “Não dava tempo de fazer nada, era só ir lá pra ver o tronco no chão”. Aí arrumaram uma câmera e ficaram de sobreaviso, seguindo o conselho do patrão de uma das tias. Alguém sempre ficava com a avó e, quando a caminhonete parava, corria lá com a câmera e eles não cortavam. Eles não saberiam o que fazer com as fotos, mas os funcionários da prefeitura sim, por isso deixavam de cortar e acabaram desistindo, não voltaram mais, até aquele dia.
     A história estava nesse ponto, quando passamos de bicicleta e paramos pra pedir água. Depois de esvaziarmos duas garrafas grandes, Magnus nos deu mais uma pra levarmos, congelada. Perguntei se ele entrava na internet e, diante da confirmação, passei pra ele o endereço do Núcleo Piratininga de Comunicação, coordenado por Claudia Santiago e Vito Gianotti. “É uma rapaziada solidária, que trabalha denunciando esses crimes que o sistema comete todo dia contra a população mais pobre, pra beneficiar empresas. Eles devem saber o que cês podem fazer pra se defender.”
     Antes de sairmos pra estrada, ele foi ao fundo de sua pequena floresta e buscou, pra nos oferecer, um dos tesouros defendidos da destruição – mangas carlotinhas, maduras, doces e fresquinhas -, colocou num pacote e nos deu, com o maior dos sorrisos. 

observar e absorver

Aqui procuramos causar reflexão.