sábado, 14 de dezembro de 2013

Republicando um textículo natalino

O rompimento com a família fora tão brutal que eu rompi com tudo o que havia vivido. O natal não significava nada. Ainda mais depois que soube ser uma data criada mais de oitocentos anos depois, pela igreja católica apostólica romana, para submeter as religiões nórdicas que nesse dia comemoravam o dia do solstício, da fertilidade da terra, de homenagem às deusas e deuses da natureza. E que só sobreviveu como data porque interessava aos empresários da época uma festa de consumo, onde se gastaria pra eles lucrarem. Aí dá-lhe publicidade, massacre midiático, tudo gira em torno do natal, como do carnaval, do dia das mães, dos pais, dos namorados,...

Mas não adianta, nessa época as pessoas vibram diferente, o astral muda, dá pra sentir. As pessoas ficam mais solidárias, as famílias se reúnem, há todo um clima. Melancolia nas periferias, alguns conseguem amenizar com  uma confraternização em família, grupos se reúnem, os mais diversos, em todas as partes. O pouco se torna muito, há reuniões de excluídos e são lindas, por se basearem inteiramente no afeto. Ali o ser humano mais barbarizado mostra seu lado afetivo, amoroso. Muitas vezes vi acontecer.

Nessa época me parecem muito gritantes as diferenças sociais. Se houvesse uma visão humanística, uma visão de família humana, seria constrangedor dispor de excessos enquanto há tanta gente sem o necessário pra sobreviver. Não é possível entender o porquê da miséria, da pobreza, do abandono, da ignorância. Com todo o desenvolvimento acadêmico, toda a capacidade tecnológica, não se pode acabar com a ignorância, com a desassistência médica e tantas abjeções da sociedade? Duvido. Capacidade tem. O controle empresarial é que não deixa.

A imagem imposta de papai noel é a inteira hipocrisia da sociedade. Quem não come direitinho, as três refeições do dia, fora lanchinho, não ganha presente. A maioria das crianças não ganha.

Eduardo.


+++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++


A Santa Claus


Por Luis Sepúlveda


Estimado Santa Claus, Papai Noel, Bom Velhinho,
ou como queira chamar-se ou ser chamado.

Confesso que sempre lhe tive simpatia porque, em geral, me agrada a Escandinávia, sua roupa vermelha me dá um sentimento premonitório e porque, por trás dessas barbas sempre acreditei reconhecer um filósofo alemão que, a cada dia, tem mais razão no que afirmou, em vários livros muito citados, mas pouco lidos.

Não tema pelo teor desta carta, não sou o menino chileno que, há muitos anos lhe escreveu: “Velho safado, no ano passado te escrevi contando que, apesar de ir descalço e em jejum à escola, consegui tirar as melhores notas e que o único presente querido era uma bicicleta, sem querer que seja nova. Não teria que ser uma mountain bike, nem para correr o Tour de France. Queria uma bicicleta simples, sem marchas, para ajudar minha mãe a levar as roupas que ela busca, lava, passa e entrega. Isso era tudo, uma humilde bicicleta. Mas chegou o natal e eu ganhei uma estúpida corneta de plástico, brinquedo que guardei e te envio com esta carta, para que enfies no cu. Desejo que pegues AIDS, velho filho da puta”.

Foram seus elfos, os responsáveis por tão monstruoso desrespeito?

Pois bem, estimado Santa Claus, seguramente este ano receberá muitos pedidos de bicicletas, pois o único porvir que espera os meninos do mundo é como entregadores, mensageiros e trabalhos sem contrato de trabalho, condenados a distribuir pacotes e quinquilharias até os 67 anos de idade. No entanto, não lhe peço uma bicicleta. Peço, em troca, um esforço pedagógico, que ponha seus elfos, anões, duendes e renas para escrever milhões de cartas explicando o que são e onde estão os mercados.

Como você bem sabe, eles nos têm fodido a vida, rebaixado os salários, arrasado as pensões, retirado benefícios das aposentadorias e condenado as pessoas a trabalhar permanentemente, para tranqüilizar os mercados.

Os mercados têm nomes e rostos de pessoas. São um grupo integrado por menos de um por cento da humanidade, donos de 99% das riquezas. Os mercados são os integrantes dos conselhos de acionistas, como são acionistas, por exemplo, de um laboratório que se nega a renunciar aos royalties de uma série de medicamentos que, se fossem genéricos, salvariam milhões de vidas. Não o fazem porque essas vidas não são rentáveis. Mas a morte sim, é, e muito.

Os mercados são os acionistas das indústrias que engarrafam suco de laranja e que esperaram até que a União Européia anunciasse leis restritivas para os trabalhadores não comunitários, que serão obrigados a trabalhar na Espanha ou outro país da U.E., sob as regras de trabalho e condições salariais de seus países de origem. Logo que isto aconteceu, nas bolsas européias dispararam os preços da próxima colheita de laranja. Para os mercados, para todos e cada um destes acionistas, a justiça social não é rentável, mas a escravidão sim, e muito.

Os mercados são os acionistas de um banco que suspende o salário mínimo de uma mulher que tem o filho inválido. Para todos e cada um dos acionistas, gerentes e diretores dos departamentos, as razões humanitárias não são rentáveis. Mas os despojos, as expulsões da pobreza para a miséria sim, é. E muito. E para os ladrões de esperança, sejam de direita ou de direita – pois não há outra opção para os defensores do sistema responsável pela crise causada pelos mesmos mercados –, despojar da sua casa aquela senhora idosa foi um sinal para tranqüilizar os mercados.

Na Inglaterra, a alta criminosa das tarifas universitárias se fez para tranqüilizar os mercados. O descontentamento social levará a ações inevitáveis pela sobrevivência e os mercados pedirão sangue, mortes, para tranqüilizar seu apetite insaciável.

Que seus duendes e elfos expliquem, detalhadamente, que no meio desta crise econômica gerada pela voracidade especulativa dos mercados – e pela renúncia do Estado a controlar os vai-véns financeiros –, nenhum banco deixou de ganhar, nenhuma sociedade multinacional deixou de lucrar e até os economistas mais ortodoxos das teorias de mercado concordam em que o principal sintoma da crise é que os bancos e as empresas multinacionais lucram menos mas, em nenhum caso deixam de lucrar. Que os elfos e duendes expliquem até ficar claro que foi o mercado quem se opôs a (e conseguiu eliminar, financiando campanhas de legisladores a seu serviço - n do T) qualquer controle estatal às especulações, mas agora impõem que o Estado castigue os cidadãos com a diminuição dos seus rendimentos.

E, por último, permita-me pedir-lhe algo mais: milhares, milhões de bandeiras de combate, barricadas fortes, paralelepípedos maciços, máscaras anti-gases, e que a estrela de Belém se transforme numa série de cometas incandescentes com alvos fixos: as Bolsas, que queimem até os alicerces, pois as chamas dos formosos incêndios nos dariam, ainda que temporariamente, uma inesquecível Noite de Paz.

Muito fraternalmente


Fuente: Le Monde Diplomatique                                                                     Tradução - Eduardo Marinho

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

O poder real, por trás dos poderes públicos. Ou por cima.

O livro, "Confissões de um assassino econômico", discorre em detalhes todos os dramas internos, além dos procedimentos do poder financeiro sobre os países, que passaram em seu sentimento. A culpa e o conflito interno sempre existiram enquanto ele cumpria seu papel corporativo, dentro do esquema. O livro foi escrito nessa base. E é precioso, pelas informações que espantam alguns, mas não surpreendem, por explicar porquê a sociedade é tão injusta, porquê se tem tanta miséria, ignorância, abandono e sofrimento. E porquê a "política" é tão corrupta, a partir dos corruptores.

Estamos com a “terrível presença do norte” em nossas almas. Esse vídeo faz o resumo de um livro que li alguns anos atrás, “Confissões de um assassino econômico”, de John Perkins (esse mesmo do vídeo), que explica de forma simples e clara de como funcionam as coisas mundiais. John foi um executivo das multinacionais. Um economista que fazia planos de infraestruturas nacionais, sendo construídas pro desenvolvimento dos países, na verdade uma forma torpe de atrelar financeiramente os países aos poderes econômicos. Quem construía eram empresas dos Estados Unidos, o dinheiro nem chegava nos países, eram passados diretamente às construtoras que se escondiam sob o governo, comandando-o.

Não questionamos se o que desejamos é o que nós desejamos mesmo, ou o que nos fizeram desejar. Não percebemos toda a rede de convencimento, de criação de idéias, de valores, de visões de mundo. Exercemos valores e comportamentos condicionados, que servem à manutenção dessa estrutura social. Uma rede criada por um punhado de pessoas que perceberam formas de controlar e dominar a sociedade, de criar vontades e opiniões a seu serviço. Há televisões em todas as casas, formando opinião, empurrando uma visão de mundo que só serve aos poucos riquíssimos, donos de bancos e mega-empresas. São esses que plantam os desejos de consumo, o julgamento de valor humano pela forma, pela roupa ou classe social, os que vivem da angústia das populações, explorando, enganando, controlando políticos e mídia, a televisão, o rádio, os jornais... A vida é um inferno pra grande maioria. É preciso questionar a nossa própria visão de mundo, é preciso pesquisar entre as nossas vontades, entre os nossos valores, quais nos foram implantados? Quais são realmente nossos? De quantas mentiras a gente se deixou convencer? Quanta coisa que a gente acredita que é simplesmente mentira? Eu mesmo não tenho a menor pretensão de “vencer na vida”. A mim me basta viver. Não quero ser melhor que ninguém, se possível gostaria de ser melhor do que eu fui, ontem, de estar aprendendo e melhorando como possa.

Somos nós quem sustenta essa porra toda, somos nós quem pode realmente mudar alguma coisa. Individualmente antes, coletivamente por conseqüência. Essa é a razão da educação pública ser uma merda. Os que comandam têm pavor da idéia de um povo instruído, informado e com um nível de consciência alto, capaz de debater, resolver e decidir os rumos da sociedade. Por isso as escolas públicas não são de qualidade, ai do político que se atrever a investir dinheiro público em educação, ai do que servir à maioria. Há uma televisão na casa de cada um, cada família, mentindo barbaridade, distorcendo a realidade, superficializando o pensamento, induzindo ao consumo como valor social, entre tantos crimes morais, senão legais. Somos (nós, a maioria) mantidos ignorantes e desinformados por decisão dos que dominam, dos que ostentam luxos e desperdícios, convencidos da sua superioridade humana. É preciso perceber o nosso próprio valor. É preciso não se deixar convencer pelos absurdos que a mídia propaga – é preciso ver a mídia como inimiga pública, enquanto for empresarial. Não pra desprezar ninguém, mas pra não se sentir inferior como nos mandam. Dignidade não é arrogância, é preciso não confundir as coisas. Humildemente, não me sinto inferior a ninguém. E se me aparece um convencido da própria superioridade, eu acho é graça. Nem discordo e, se for preciso, faço uma reverência pra ele ir embora. Tenho mais com o que me ocupar nessa vida. O sentimento de inferioridade que se propaga por aí não me toca. O valor é humano, é sentimento, é pensamento, é integração na coletividade humana, é consciência. O problema é confundir valor com preço.

As escolas ensinam a consumir, a disputar, a competir, a querer ser melhor que os outros, a criar conflitos e viver confrontos, com sentimentos de vitória e derrota, ambos deprimentes, cada um à sua maneira. As instituições estão dominadas através do poder “político”.
Pra ter sentido na vida, é preciso andar na contramão.

“Hoje há mais escravidão no mundo do que nunca existiu antes”.  John Perkins

Hoje os escravos fazem fila pra se escravizar.



Publicar postagem

O vídeo deixa uma questão em aberto. Acima dos vampiros da humanidade, dos megadominadores, há um poder maior, exercido por todos. É a nossa concordância geral o que sustenta esse sistema social espúrio, criador de sofrimentos pra grande maioria. É preciso ver por si, pensar por si, escolher por si o que se quer da vida. É preciso conferir até onde os próprios valores não foram implantados por artimanhas da publicidade midiática, os comportamentos, os objetivos de vida... há muita coisa pra se criar, pela frente. No mínimo dar um sentido à existência, além das fumaças da ilusão do consumo.

quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Malucos de Estrada - A reconfiguração do movimento "hippie" no Brasil (ou o outro lado do sistema, seus furos e imoralidades)

Mais uma vez esse apelo é feito ao público pra financiar o filme - documentário a meu ver importante no sentido de expor opções fora do padrão de existência imposto pelas convenções. Em busca de um sentido mais profundo na vida do que consumir, acumular, disputar e desfrutar de bens materiais egoizados, vive-se de modo solidário, amoroso, em harmonia com a natureza e com as coletividades do planeta, sem ambições além das da alma, de viver em paz. Ou pelo menos se tenta.

Rafael Lage é uma pessoa que emana essa freqüência, olhar carinhoso e firme, opiniões suaves, profundas e fortes, talhadas na lida do viver, encarando o sistema social repressor e a difamação pela mídia de todo sistema de vida fora do comum, pela mentalidade convencional preconceituosa e superficial. Esse moleque, com suas três décadas, merece confiança.

Aí um pedacinho dos retalhos que formarão o doc. Quem puder, compareça como possa. Vale demais a pena.

Entrevista depois da palestra - Santa Maria, RS

Essa entrevista foi feita logo depois da palestra, em Santa Maria, RS. Rápida e certeira, fala simples e diretamente das motivações pra essa vida arriscada que arrumei, sem contar com proteção. Mas senti muitas vezes a interferência inexplicável, em muitos momentos críticos, com acontecimentos, encontros e "acasos" providenciais na hora agá. Deve haver uma conta enorme pra mim, quando chegar do outro lado da vida, pelo trabalho que dei aos protetores, se é que dá pra chamar assim. Várias vezes senti presenças, toques e inspirações que alguns explicam, sobretudo espíritas, umbandistas, candomblecistas, budistas e demais reencarnacionistas. Há até explicações católicas e evangélicas. Mas eu, em minha teimosia de mula, me agarro na dúvida e não tenho nenhuma explicação como certa. Não sei, não posso saber, só sentir. E não permito à minha razão a arrogância de explicar o inexplicável, entender o incompreensível, conceber o inconcebível. Não tenho pressa. Minha espiritualidade é exercida na matéria, no trato com o mundo, com os acontecimentos, nas relações pessoais, na vida. Pelo menos enquanto eu estiver na matéria, meu sentimento, minha intuição, vale mais que minha razão. De explicações impostas sob ameaça o mundo tá cheio.

Santa Maria foi de ótimos contatos, muita gente de olho brilhando, exceções que se multiplicam.



domingo, 10 de novembro de 2013

Tapa na cara do secretário - quem diria que eu aprovaria... LIBERDADE PARA EDUARDO FAUZI - O tapa do povo.

Esse é o cara que agrediu o secretário do governo, que foi mostrado na mídia sem nenhum aprofundamento. Ouvindo o que ele tem a dizer, é fácil entender. Essa história precisa ser conhecida, acontece todo o tempo, em todas as partes. O que tem de raro aí são as razões serem mostradas, além da simples criminalização que esconde os motivos. Não interessa ao poder vigente - e não estou falando de políticos, governantes ou autoridades em geral - o esclarecimento da estrutura social espúria, dominada por interesses econômicos. Nem do deboche, desrespeito e ações criminosas do Estado contra o povo, principalmente os mais pobres, mais sacaneados pelas instituições, sabotados, explorados, enganados e torturados a vida toda.

Nunca imaginei que aprovaria um tapa na cara, embora não seja bem 'aprovar'. É que entendi tão completamente essa explosão de raiva que não consigo desaprovar. Pequeneza minha? Talvez. Todos temos muitas pequenezas. Mas se eu estivesse nas mesmas circunstâncias - e sou favorecido nesta análise por ter passado muitas situações parecidas, embora não com um secretário de estado dando mole por perto - não sei se não teria a mesma explosão. Espero que fosse com palavras, mas tão precisas, afiadas e contundentes que o cara me avançasse por conta própria. Aí sim, eu me sentiria em casa, pelo menos pra bandar ele e falar um pouquinho mais enquanto ele se levantasse - nada de chute na cara.

Lendo por trás de tudo que o cara fala se vê a estrutura macabra por trás do poder político, os vampirescos interesses megaempresariais que comandam a sociedade falsamente democrática. Cada vez mais claro, embora a narcose midiática, somada à ausência de educação (sinto um mal estar quando ouço alguém falar em "melhorar" a educação, pois não se melhora o que não existe - por ter sido destruído) faça seu papel alienante. As exceções se multiplicam e se põem a trabalhar. Sua existência se torna sua função na coletividade.

Os que se apresentam como autoridades e representantes do povo ou do Estado, não são nada mais que marionetes numa fachada mentirosa, construída pra encenar uma democracia hipócrita onde se vê a população ser desrespeitada cotidianamente, usada na sustentação da estrutura social que a massacra e estraga a vida desde antes do nascimento. Foi pra manter essa estrutura que se destruiu a educação, cooptando a pequena parte eficiente pra formar profissionais de mercado, e não seres humanos pra viver em harmonia numa coletividade justa. É preciso levantar os véus e a comunicação é a área mais importante nessa tarefa. Não é à toa que os conglomerados midiáticos se empenham tanto em impedir o acesso da população às comunicações e à sua produção. O monopólio lhes é vital.

O espetáculo das marionetes da política institucional e partidária se desmoraliza e desmascara. Muito pouco a pouco, pro meu gosto, mas não se pode impor o ritmo. É preciso perceber as oportunidades e aproveitar, trabalhar com elas e nelas, pra não perder o ânimo com expectativas indevidas. Trabalhar na direção de uma sociedade melhor já é uma satisfação que justifica a vida. O que não se justifica é criar a expectativa de viver em um mundo justo, com tantas raízes a arrancar - esse é um trabalho de gerações no processo da grande família humana através dos tempos. Caminhamos, ora, caminhamos sem parar. O destino é a caminhada. E é caminhar neste sentido que satisfaz.
________________________________________________________________________________

Importantes colocações desvendam o funcionamento do estado e suas instituições a serviço das empresas que o seqüestraram com a conivência de políticos comprados. As colocações de Eduardo Fauzi escancaram o desprezo cotidiano do falso poder público pela maioria mais pobre. Ele foi preso de novo depois de três horas desta entrevista. A família tá com uma página pra tentar defender o cara da vingança a que ele está sendo alvo. O ataque foi simbólico, lava a alma de muita gente e, na cabeça dos criminosos institucionais, deve ter conseqüências "exemplares". Aí o link:  https://www.facebook.com/liberdadeeduardofauzi?hc_location=timeline

                                      Liberdade para Eduardo Fauzi




O discurso do prefeito no final deve ser outro "tapa na cara" pra muita gente. Pra mim, a surpresa é apenas por essa fala vir a público. Claro que um público restrito aos que buscam se informar e já sabem a estupidez que é acreditar na mídia além de receitas culinárias e da previsão do tempo. Mas antes isso não acontecia. Essa é a diferença fundamental, devemos exercer e ampliar ao máximo as comunicações. Divulgar, sensibilizar, esclarecer, conscientizar são tarefas fundamentais nesse momento histórico. O prefeito não fala de "vender" apenas sua cidade, mas de vender o país. É essa corja que se aboleta nos poderes públicos pra cometer "crimes de estado" contra a população a favor de um punhado de podres de ricos.

terça-feira, 22 de outubro de 2013

Uma em cima, outra em baixo - no fundo é a mesma coisa.

Cheguei em Foz do Iguaçu e fui recebido por Detrudes, Luiz e Rodrigo. Fomos ao hotel onde me hospedaria e a umas cervejas, na seqüência. Eles foram receber outros palestrantes depois, eu fiquei no hotel, completando o serviço com o frigobar. No dia seguinte fomos às cataratas, impressionante volume de água, impressionante estrondo - mas tive ali a mesma sensação que me provocam o Corcovado e o Pão de Açúcar, tomados por interesses empresariais que impregnam a sociedade de todas as formas, com a elitização da área. Ali se apaga a sociedade onde vivemos, como é característica das áreas elitizadas, se apossando das belezas naturais, e se esquece a precariedade em que são atiradas imensas parcelas da população, inclusive os que se incumbem dos trabalhos do parque. Tudo parece armado em nome da grana, excluindo e ignorando os grandes desequilíbrios humanos, a pobreza material da maioria e a pobreza espiritual da nossa coletividade. Isso me incomoda bastante e não permitiu que eu usufruísse plenamente das belezas naturais, consciente de sua "exclusivização". A comida do almoço era ótima, mas a ostentação do restaurante sempre me estraga o sentimento. Ao menos as companhias eram ótimas.

Não pretendo aqui reclamar de nada, nem responsabilizar quem quer que seja, a recepção e o tratamento foram exemplares, não podia ser melhor. Boas pessoas que se percebe pelo olhar, faziam parte da equipe do TEDxAvCataratas, desde o Sebastian, que estava na cabeça da organização, até os meninos e meninas da base, recebendo, preparando, fazendo o evento acontecer em harmonia. Os palestrantes, todos, evidenciavam um bom coração; as palestras foram ótimas, todas indutivas à reflexão, ao questionamento de valores como se faz necessário desde sempre, mas que é tão raro, desestimulado pelo sistema vigente. Me parece, porém, que eu era o único periférico da área, com vivência de rua, de carência, de marginalidade e exclusão - se não na origem, a partir dos dezenove anos e até hoje, com quase 53 anos. Os primeiros dezenove anos da minha vida me deram condições próprias de interpretar a realidade do ponto de vista da miséria material. Daí portar algumas visões diferentes dos outros palestrantes, algumas vivências não experimentadas ali - embora não faltassem vivências fortes, profundas e modificadoras, como se vê pelas palestras feitas. Em minha cabeça e coração, a maioria sabotada, explorada e excluída dos benefícios das tecnologias jamais desaparece, eu a vejo toda hora, em todas as partes, mesmo na sua invisibilidade. As mãos pobres estão nas paredes, nas poltronas, nas cortinas, na limpeza, na comida de alto nível que comemos, nas roupas e sapatos à minha volta, nos equipamentos, no asfalto, na calçada, em toda parte eu vejo. E me incomoda ver como isso é esquecido, ou não percebido. Parece que tudo foi feito automaticamente, não é fruto de injustiças sociais. Não consigo nem quero esquecer o suor, o esforço, a exploração dos que construíram todos os espaços, desde os públicos até os privados, desde os simples até os luxuosos. A base de tudo em nossa sociedade primária é a exploração do trabalho dos mais pobres, mantidos desonestamente na ignorância, na desinformação, na exclusão, na inferioridade social. E isso me dói, quando vejo explícito.

Sem querer ferir susceptibilidades, restringi a palestra às minhas vivências, aproveitando o escasso tempo. Não me parece produtivo levantar barreiras acenando com responsabilidades não percebidas, usufrutos indevidos e excessivos. Cobranças e acusações são prejudiciais, diante da naturalidade da inconsciência, quando se pretende apresentar reflexões e vê-las recebidas. Com carinho e afeto se é sempre bem recebido; com arrogância apenas se levantam antagonismos e mal estar. Uma tendência comum e imbecil.

Além do mais, meus pontos de vista são meus e não me sinto no direito de impor a outros.

Abaixo, a palestra, curtíssima, como é o padrão do TED.



À noite, depois da palestra, fomos a um bar no lado argentino. Por coincidência, de dois brasileiros. Um desenho meu ficou lá, na parede, o da América Latina, "pela integração dos povos latinoamericanos". Chamou minha atenção não ter visto nenhum carro de polícia pelas ruas cheias de casas noturnas. Só vi na fronteira. Ali tive que mostrar a identidade pra moça do computador.

Saí do hotel no dia seguinte e fui pra Cidade Nova, pra casa do meu camarada Mano Zeu, lutador incansável das periferias de onde é originário, com suas letras ácidas e esclarecedoras, em protesto permanente contra as falcatruas do poder vigente e a inconsciência em que são mantidas as favelas e bairros pobres. Ali não se espera pelos poderes ditos "públicos", se parte pra fazer e se faz. Do cinco estrelas ao barraco foi uma trajetória - parecerá estranho a alguns - ascendente. Se não em matéria, mas em alma, em comportamentos espontâneos sem formalidade alguma. Ali ninguém diz "pois não, senhor", nem usa qualquer tipo de formalidade chique, como no hotel onde estava. Não vai aqui nenhuma reclamação, nenhuma condenação aos costumes formais dos "altos" da sociedade. Apenas revelo muito mais identificação com a simplicidade, com o mínimo necessário, com as condições dos de baixo, resistentes da sobrevivência contra todo o esquema montado desde séculos - benefícios pra poucos, sacrifícios pra maioria. As condições favorecem a aproximação e a solidariedade.

Encontrei o Danilo Georges, também, logo na seqüência. Na casa do Zeu, com três colchões dormimos em seis, um argentino, um venezuelano, um colombiano, um pernambucano e o próprio Zeu. E eu, claro.

No dia seguinte, almoço na casa do Zé, muita preparação no CNI (Cidade Nova Informa), a biblioteca pau pra toda obra que eles conseguiram montar lá, cobrando de deus e o mundo na prefeitura, até conseguir, com as migalhas e as doações, colocar pra funcionar. É o centro cultural da área. Heróico. Assim como heróicas as pessoas que se dedicam a levar adiante, como diz o nome do próprio fanzine deles, o "Adelante". Trouxe dois deles, vou restaurar a capa de um e reproduzir.

Biblioteca comunitária Cidade Nova Informa.

Teve rep (ritmo e poesia), teve apresentações teatrais das crianças, muita manifestação de opiniões, baita exercício de formação de pontos de vista. No abandono cultural, se faz a cultura espontânea e local, abrindo a mente pro mundo, tentando descondicionar da midiatização dominante, mostrando outras existências fora dos padrões impostos.

Falei dos sentimentos induzidos, superficiais e falsos, com base na forma e não no conteúdo, disse da realização real e da falsidade das propostas convencionais. De enxergar o que está por trás do que nos é mostrado, de criar nossos próprios valores e comportamentos, de ver o que acontece e como se distorce a realidade pra que não vejamos o predomínio empresarial sobre o poder público, a verdadeira guerra das empresas contra os povos. De perceber nosso próprio valor e não nos deixar impressionar com as imposições culturais de mídia, que inferioriza quem tem menos e superioriza quem tem mais. Falei da maior importância do ser, em lugar do ter. Não faz sentido uma sociedade que maltrata alguém honesto, generoso, solidário e maltrapilho; e que louva os podres de ricos que compram políticos e se apropriam do patrimônio público, em prejuízo de milhões que não têm nem os seus direitos básicos respeitados. É preciso destoar desse conjunto, ainda que ao preço da discriminação.

Ali não houve como gravar a palestra, mas penso que o que falei ali é pra ficar por ali, mesmo. Muitos dos que não conhecem essa realidade cotidiana não entenderiam várias colocações que fiz. Percebi me observando que meu vocabulário, meu pensamento e meu sentimento fazem uma adaptação inconsciente. Da palestra no TED à fala no CNI houve uma mudança total. Nada premeditado ou resolvido, ao contrário, eu não sabia o que iria falar até pegar no microfone.

A Elza, com o microfone na mão, tem uma fala guerreira.
Na região da tríplice fronteira existe, entre os de baixo na sociedade, um sentimento de integração que me surpreendeu. Paraguaios, argentinos e brasileiros pobres se respeitam e se irmanam em dificuldades e lutas semelhantes.

Estive expondo na UNILA (Universidade pela Integração Latinoamericana), quer dizer, na rua em frente.  O que me valeu um contato com a segurança de uma empresa vizinha. É que eu havia pregado meus desenhos na parede da tal empresa e os caras vieram me dizer que não podia. O episódio vale um escrito à parte. Uma pequena historinha de fazer pensar. Deve ser a próxima postagem.



domingo, 13 de outubro de 2013

Orçamento devorado - que se dividam os restos com o povo





Eu lembro dos enfermos sem atendimento, dos postos de saúde fechados ou sem recursos, sem remédios, sem médicos; das escolas periféricas, praticamente abandonadas à própria sorte e à criatividade e sacrifício de educadores e funcionários, o ensino público sabotado e em ruínas, sem condições de instruir com um mínimo de dignidade e cidadania; lembro dos transportes superlotados todos os dias, em situação de tortura coletiva, sem o menor respeito pela população que constrói, mantém, sustenta e põe pra funcionar a sociedade como um todo, desinstruída e alienada pela mídia; das forças de segurança preparadas pra contenção de massas, em caso de inconformação com as situações de barbárie.

Vejo as forças de segurança atacarem a população que se manifesta por seus direitos constitucionais, defendendo os interesses dos patrões, de mega-empresários que se apossaram da política, com suas milionárias doações de campanhas eleitorais. São meros investimentos para ter lucros gigantes em obras públicas superfaturadas, isenção de impostos e todas as vantagens que o aparato "público" pode oferecer, às custas do sofrimento cotidiano da maioria. As políticas públicas são ditadas por banqueiros e mega-empresários, por associações patronais, pelo poder econômico. Dominam as instituições, sabotam a educação e contam com a mídia empresarial pra distorcer a realidade, manipular a opinião pública e impor valores e comportamentos de acordo com os interesses empresariais.

A dívida é uma armação estratégica pra submeter o país aos banqueiros mundiais, às mega-empresas transnacionais, ao punhado de vampiros da humanidade. No livro "Confissões de um assassino econômico", de John Perkins, as denúncias são claras e evidenciam essa estratégia criminosa de controlar e tornar países inteiros miseráveis, com exceção de elites locais que gerenciam o crime contra a humanidade.

Depois de "Confissões", sugiro completar o ciclo com "A melhor democracia que o dinheiro pode comprar", de Greg Palast, jornalista que, depois de publicar esse livro, teve que sair do seu país (Estados Unidos) e foi viver e trabalhar em Londres. A partir da segunda edição, ele incorporou o Capítulo Brasileiro, relatando como o Citygroup forneceu a fortuna que comprou o congresso pra aprovar a emenda constitucional que reelegeria FHC - que assumiu o compromisso de privatizar (doar pros mega-empresários) o patrimônio público do povo brasileiro, as mais lucrativas estatais, as áreas estratégicas de energia e transportes, mineradoras como a Vale do Rio Doce, Usiminas e tantas outras. Há outro livro sobre o tema, que não li ainda, "O príncipe da privataria", de Palmério Dória. Além, claro, de "Privataria Tucana", de Amaury Ribeiro Júnior.

Por isso, quando vejo esses "políticos" protestando contra investimentos sociais, contra o financiamento público de campanha, simulando defender os dinheiros e o patrimônio público, sem mencionar essa dívida-draga, sinto cheiro de podre, nojo e uma imensa raiva.

Artigo de La Fattorelli - http://www.auditoriacidada.org.br/wp-content/uploads/2013/09/Artigo-Orcamento-2014.pdf


quarta-feira, 9 de outubro de 2013

É pública minha posição apartidária - não confundir com "apolítica", que é uma posição impossível -, pela idéia de que a estrutura política, assim como todas as estruturas da sociedade, estão infestadas de interesses empresariais, que se infiltram por todas as brechas dos poderes e das instituições. A luta por espaço nas comunicações é crucial, a luta por uma educação verdadeira, por uma tributação justa, por uma sociedade mais solidária passa pela conscientização geral. A partir de dentro de cada um, nos seus próprios condicionamentos em valores e comportamentos, o trabalho externo se torna mais eficiente. Esta é a minha opinião, há quem discorde.

Dentro das instituições, porém, há gente decente trabalhando. Convivendo dentro da estrutura corrompida e sofrendo a angústia da própria diferença com o ambiente rotineiro. Não é à toa que vazam informações, denúncias, se tomam ações que resolvem problemas pontuais. Pessoalmente, estamos do mesmo lado, desejosos de uma sociedade em nome de todos, não de uns poucos e em prejuízo da maioria.

É preciso lembrar que NÃO INTERESSA a esses poucos vampiros encastelados em palácios, luxos e ostentações uma educação verdadeira. A ignorância da população é fundamental pra manter esse Estado corrupto que não cumpre nem mesmo sua própria constituição, pomposa e ironicamente chamada de "carta magna". A pompa impressiona a ignorância, a mídia a conduz. É preciso saber contra o que lutamos.

A Sônia fez um pronunciamento que traduz o que sinto diante desse quadro. Ela é parlamentar. Vereadora. Eu acho. Não me ligo muito porque não acredito que a política partidária possa ir muito além da cosmética e de ações pontuais. Válido, mas já tem gente trabalhando aí e eu tenho outras vertentes no mesmo trabalho.

_________________________________________________________________________________


"Assistimos nesta terça-feira, dia 1, a um dos mais degradantes episódios de submissão de decisão parlamentar à vontade do Poder Executivo, através da aprovação do Plano de Cargos e Salários dos profissionais da Educação, contra a vontade de seus funcionários e sem qualquer discussão com a sociedade civil.
Uma votação feita sob regime de urgência e a portas fechadas pelo Batalhão de Choque da Polícia Militar do Plenário da Câmara de Vereadores!  Nada pior poderia ficar registrado nos anais da história da Casa Parlamentar e da Educação no Rio. 
Lá dentro, 36 vereadores da base do prefeito, absolutamente fiéis não ao que acreditam como valores educacionais, mas ao que creem como lógica política. Ou seja, a troca constante de favores e benesses em seus bairros – não diretamente “mensalões, – mas empregos, cargos, asfaltos, licenças, internações, obras, entre outros. Enfim, verdadeiros xerifes das áreas.
Em algum momento sentiu-se neles qualquer preocupação, ainda que vaga ou genérica, de que talvez fosse prudente e necessário ouvir as pessoas para  poder debater esse importante Plano de Cargos de Salários dos professores e dos profissionais da Educação que cuidam por décadas de mais de 750 mil crianças do nosso Município e que comprometem o nosso futuro no mínimo pelos próximos vinte anos?
Estavam eles preocupados em saber o que se tinha a dizer a respeito das proposta dos membros do Conselho Municipal de Educação? Por algum momento seu entes foram ouvidos pelos vereadores?
E os notáveis do Conselho da Cidade foram ouvidos?  Ou os notáveis também nada tinham a dizer sobre esta questão “menor”, que é o Plano de Cargos e Salários a Educação?
Por que nem os vereadores, nem mesmo os membros das Comissões de Educação, fizeram audiência pública para escutá-los?  Por que não ouviram os inúmeros e excelentes especialistas em Educação que desenvolvem, há anos, magníficos trabalhos na cidade do Rio de Janeiro?

Plano de Carreira do pessoal da Educação na Cidade do Rio não é, definitivamente, assunto nem de palpiteiro, de novato ou de twitteiro. Não temos mais tempo a perder neste assunto. Não basta somente a informação maniqueísta do que diz o Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação em confronto do que diz o prefeito ou a sua secretária.
Queremos o debate com os pais, professores, pedagogos, alunos e técnicos. Uma politica de estado na educação básica no Rio que atraia jovens para esta profissão, que exige sempre uma doação espiritual e social.
Por isso, digo e repito, me envergonho do que vi acontecer no Plenário da Câmara Municipal do Rio de Janeiro, com professores da rede publica apanhando da polícia do lado de fora na rua e vereadores escarrapachados em suas cadeiras, com ares de absoluta indiferença, “cumprindo o determinado”.
Hoje, o Rio não amanheceu como sendo a nossa Cidade Maravilhosa. Mas, esta história ainda não chegou ao seu final, definitivamente, pois quem faz a Cidade ser maravilhosa somos nós e não eles…"
 Confira como votaram os vereadores:
Votaram SIM os vereadores Alexandre Isquierdo, Átila A. Nunes, Carlos Bolsonaro, Chiquinho Brazão, Dr. Carlos Eduardo, Dr. Eduardo Moura, Dr. Gilberto, Dr. Jairinho, Dr. João Ricardo, Dr. Jorge Manaia, Edson Zanata, Eduardão, Eliseu Kessler, Elton Babú, Guaraná, Jimmy Pereira, João Mendes de Jesus, Jorge Braz, Jorginho da S.O.S, Junior da Lucinha, Laura Carneiro, Leila do Flamengo, Luiz Carlos Ramos, Marcelino D’Almeida, Marcelo Arar, Paulo Messina, Prof. Uoston, Rafael Aloísio Freitas, Renato Moura, Rosa Fernandes, S. Ferraz, Tânia Bastos, Thiago K. Ribeiro, Vera Lins, Willian Coelho e Zico.
Votaram NÃO os vereadores Carlo Caiado, Cesar Maia e Tio Carlos.

terça-feira, 1 de outubro de 2013

Papo com Ricardo

Esse papo rolou em 2011, de lá pra cá o Ricardo teve um casal de filhos, Fernando e Eduarda. Sempre pensei em publicar nossas conversas, mas a intenção era colocar no papel, fazer livrinhos manuais, por serem curtos, pequenos e fáceis de vender. Além de serem bons de ler, na minha opinião, claro. 

Ricardo é meu amigo há anos, dessas amizades raras que duram a vida inteira. É como se a gente fosse formando uma família com base na afinidade, não na consangüinidade. Se a reação for boa, publico outros.

Sei que o blogue tá meio abandonado de novo, por isso vim dar uma capinada no mato. Logo devo recomeçar as publicações. Espero. A vida não anda fácil, não, e o que me banca é o trampo de rua, os desenhos, as pinturas. Daí a ausência. Abraços a todos e bom proveito.

Eduardo. 

A Lua de mel e o pastor de Jesus

- Falaí, Edu... já voltou ou não?
- Tô em casa.
- Quando chegou?
- Quinta-feira antes do carnaval.
- Ah, tem tempo, então. Fez alguma coisa no carnaval? Viajou?
- Passei o último fim de semana num sítio em Parati.
- Que beleza, hein, foi acompanhado?
- Fui. Com aquela dona que te falei, tava em banho maria.
- Que dona é essa... a cantora?
- É.
- Ah, tá. E foi legal, lá? Levou os trampos?
- Demais, o sítio é lindo, cheio de cachoeiras, longe pra raio, isoladão. Não tinha porque levar trampo. Mas ela me pagou pra ir. Motorista. A motorista dela, amigona – a mina é motorista de ônibus, cara –, faz um bico dirigindo pra ela, que precisa ter carro, mas não dirige. Ofereceu o que pagaria a ela, pra ir no sítio. Até porque, quando me chamou, eu disse que não iria a lugar nenhum, sem trabalhar.
- rsrsrs... gigolô!!!!
- Tu não podia deixar passar essa, né?
- kkkkkkkk... Não podia mesmo. Aqui... tá sabendo a novidade? Tô casando em outubro... eu acho. Rsrs
- Eu acho? Que é, pressão?
- rsrs Não... é que eu não sei se vou conseguir arrumar tudo, até lá. Vamos fazer uma coisa simples, pra poucos convidados.
- Arrumar o quê?
- É muito detalhe. Cartório... local da festa... casa... mobília... lua de mel... etc, etc, etc...
- Bobagens... Lua de mel?
- Lua de mel, sim. Bobagens que custam dinheiro, tempo... e disponibilidade, claro.
- Seria melhor ‘festival inicial de sexo”.
- huahuahuahuahuahuau... tem que ter um lugar legal pra esse festival.
- Lua de mel é xaropada. Careta.
- Tudo bem, concordo com a expressão “festival continual de muito sexo”. Continual porque não vou iniciar nada, né?
- Não. Mas serão dias dedicados, principalmente, ao sexo comemorativo da união estabelecida.
- Ah, entendi.
Estamos escolhendo entre o Morro de São Paulo, na Bahia – minha irmã foi pra lá no carnaval, disse que é uma coisa maravilhosa – ou então um desses navios de cruzeiro.
- Morro de São Paulo é Argentina...
- Que Argentina o quê, ô maconha, é na Bahia. Pelo menos esse que eu tô falando.
- É na Bahia, mas é Argentina.
- Ah, entendi.
- Cê falou em cruzeiro?
- Falei. A Faby quer ir nessa merda de qualquer jeito.
- Navio de cruzeiro?!
- É, transatlântico. Desses que passam por Fernando de Noronha.
- Tem vergonha na cara, não, ô pequeno burguês?
- kkkkkkkkkkk... é a vontade dela.
- Putz, que deprimente... quer ir pra ilha da fantasia...
- Eu vou fazer o quê? Prefiro essa parada na Bahia, mas se ela bater o pé, eu vou.
- Que triste.
- Obrigado. Também estou muito feliz.
- Lamento sua sorte, companheiro. Em pouco tempo, vai ter uma barriga nesse teu corpo magro.
- Dispenso seus lamentos e lamúrias. E eu já estou com barriga. Ela vai muito bem, obrigado.
- Daqui a pouco cê vai estar contando como foi feliz a sua juventude.
- Ah, que bom que você acha isso. Realmente é tudo o que espero, que suas palavras se transformem na mais pura realidade.
- Alienado, flácido, acomodado e “feliz”. Cada um com sua sina...
- De pau ereto, fazendo muito sexo e aproveitando a vida. Muito “feliz”. Eu adoro a minha sina. Kkkkkk
- Questão de tempo. Com 35 vai estar mais velho que eu.
- Questão de tempo, eu vou dizer como você está errado.
- Ah, eu já vou ter morrido.
- Mas discutir com você é impossível. Então vou deixar que o tempo revele quais são realmente meus planos.
- Seus planos são bem planos, mesmo, hein?
- É, cara, meus planos são muito maiores do que um simples julgamento de como será a minha vida, baseado numa lua de mel... que nem decidi ainda pra onde vai ser.
- Há sinais, vê quem é capaz.
- E você é o capaz na história, né?
- Questão de prática, bundão. Reconhecimento, precisa não. Crédito, precisa não. Vai aí, boi. Passarinho de gaiola.
- Você não sabe de nada, seu babaca. Agora eu sou um novo homem. Parei de fumar maconha e de beber. Entrei pra Igreja Internacional.
- Tu gosta mesmo é de alpiste.
- E o pastor me disse que eu vou me dar muito bem na vida, terei todo o dinheiro que eu quiser e o mais importante...
- Cê vai é dar muito na vida.
- ... se eu der um pouco pra ele... não vou para o inferno.
- Tá vendo aí?
- Ou seja, estou no caminho certo.
- São os parâmetros de felicidade. Vai aí, boi. Ou vaca.
- Eu vou passar aí, Edu. Vou levar umas revistas que o pastor me deu. É muito importante que você leia e aceite Jesus.
- É bom, acabou o papel higiênico aqui em casa.
- Não queira conhecer o inferno... se você pedir perdão pelos seus pecados eu vou lhe conceder a luz divina.
- Sua luz divina você pode enfiar no olho cego.
- Oh!!!!!!! Não quero mais ouvir essas blasfêmias... que Ele te perdoe. Você não sabe o que diz... acho que está possuído. Tô ligando pro pastor e dando seu endereço... ele vai passar aí pra tirar o capeta do seu corpo... calma, amigo, eu vou te salvar.
- Vem, viado, que eu vou te mostrar o tamanho do que tu vai salvar.
- huahuauhuahuauhuahuauhauah Deixa eu trabalhar, cara. Tô rindo aqui, sozinho, e neguinho já tá me olhando estranho. Kkkkkkkkkkkk
- Eu também tenho mais o que fazer. Aparece depois.
- O recado tá dado. Vou casar. E mesmo você estando possuído, está convidado. Será um prazer contar com a sua presença na comemoração. Vou dar uma passada aí essa semana.
- Me lembra quando chegar mais perto. Daqui pra lá, eu esqueço.
- Beleza.
- Abraço, compade.
- A gente ainda se fala, antes. Abração.

- Inté.

terça-feira, 3 de setembro de 2013

Brutos em Belo Horizonte, de 3 a 6 de setembro

Em 8 de setembro, eis a primeira parte da palestra na mostra - depois dos vídeos, claro.

http://www.ustream.tv/recorded/38206163

Essa é a segunda parte:

http://www.ustream.tv/channel/os-brutos

Não consegui postar o vídeo em si, mas o link leva a ele, sem problema.




=======================================================================


Estou em Belo Horizonte no evento Brutos, convidado por meu amigo da antiga, Daniel Carneiro. Cheguei agora há pouco, virado, e já estou na av. Brasil, 75, sala 3, segundo andar, no antro do Brutos. Aos que se interessarem, hoje à noite devo expor e palestrar junto com o Rafael, do doc Malucos de Estrada. Não pude avisar antes, sei que tá em cima da hora, mas dá tempo ainda.



quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Florianópolis


 Chegando em Floripa, a primeira parada foi na tv Floripa, uma emissora nada comercial, alternativa, fora do padrão - não fosse assim e acredito que jamais eu seria entrevistado com tanta liberdade. Juliana, que me encontrou no aeroporto, me passou ao Guido, um arquiteto que dá pinta de mau humorado, quando discorda de alguma coisa, mas que tem um coração do tamanho dele mesmo, que me levou à tv Floripa, pra essa entrevista aí. Eu não sabia, nem esperava. Mas foi como uma recepção de boas vindas a Florianópolis. Como sempre, foi no improviso. O Sílvio tem o pique, não tinha pauta nem nada, foi levando na criatividade e na percepção. Num clima fantástico de humanidade e descontração, em alguns minutos começamos a gravar. O que vi de problema foi o pouco tempo, característica desse tipo de comunicação. Televisão tem sempre o tempo contado, tudo programado, alguns minutos de excesso, além do previsto, e atrapalha toda a programação. Tanta coisa pra dizer, tanto assunto pra tratar, acabei atrasando o Sílvio em alguns poucos minutos, na minha compulsão palavrória. E ele foi tolerante, sereno e não reclamou. Assisti depois e gostaria de ter acrescentado muitas coisas, colocado melhor tantas outras, mas o improviso é isso, sai do jeito que vem. Que tevê maneira essa, gostei muito do ambiente, da freqüência, do clima humano e ligado.





A palestra na UFSC foi gravada por uma figuraça com quem não pude conversar porque ele foi embora antes do final, tinha um compromisso e não previu a extensa duração - em volta de três horas -, mas cuja vibração me era muito simpática. Falei um pouco e depois as pessoas participaram, com perguntas, colocações, opiniões, abordagens de vários assuntos, isso faz o papo seguir sem previsão de final, a Juliana foi quem teve que dar por encerrado, ela foi quem tratou o auditório com a administração e sabia das limitações. Pela expressão dela, quando expôs a necessidade de finalizar, já havia extrapolado em muito o tempo previsto, ou combinado com os burocra da universidade - e já tinha sido um sufoco pra arrumar, doze assinaturas, professores, departamentos, a burrocracia planejada pra dificultar ao máximo a autonomia das pessoas em usar os aparelhos que deveriam ser e carregam o nome de públicos. A Ju imagina que em dez a quinze dias o cara edita - comé mesmo o nome dele, Ju? - e aí ela manda. E eu publico na seqüência, aqui nesta mesma postagem.

Bueno, em 27 de agosto, Juliana manda sua arrumação do que foi feito com a câmera cinematográfica do João e o que ela gravou na câmera fotográfica, depois de acabar o filme. Enorme.

Parece tanto tempo e foi tão rápido...






quinta-feira, 1 de agosto de 2013

Medicina oferecida por Cuba ao mundo e dedicada aos pobres

Esse é um filme feito por estudantes de medicina. Nâo se pode esperar qualidade técnica. Apenas cansaram de passar por mentirosos, quando falavam da medicina cubana, e resolveram documentar a parada. Essa é a medicina do futuro, uma medicina humana, solidária, sem condições pra atender além da necessidade de qualquer pessoa. Qualquer um que precise, sem distinção, recebe o melhor atendimento possível, com todos os recursos disponíveis. Em Cuba, não existe medicina particular - tremam, gananciosos. Não há laboratório farmacêutico privado, nem planos de saúde.

O ódio à medicina cubana tem essa raiz. A ganância, o egoísmo, a indiferença com o sofrimento de milhões. Por isso a repulsa a essa medicina humanitária. Mas o trabalho da mídia, profundo, constante, faz a maioria rejeitar essa realidade e acreditar que a ilha é um presídio dominado pelos milionários irmãos Castro, ditadores sangüinários que escravizam o povo cubano. 

Na verdade é um Estado não dominado por interesses empresariais, como o nosso, e que se coloca a serviço de sua população. Daí a fúria da mídia empresarial, porta voz dos interesses daqueles que são o pior que a humanidade tem, os vampiros da humanidade, mega-banqueiros e empresários das transnacionais. Esses impérios dependem da existência da miséria, da pobreza, do conflito, da competição desenfreada, da desunião, da angústia e do sofrimento, da exploração e do controle de parcelas imensas da humanidade. 

Não é à toa que os jornalistas e comentaristas repetem com tremor de indignação palavras pra causarem sentimentos ruins, terroristas, comunistas, ditadura, guerrilheiros, anarquia, violência, decadência, estamos perdidos, estamos fritos, o mundo vai desabar, vai faltar comida, seremos todos escravizados pela ideologia esquerdista neo pentecostal e é o apocalipse.

O pânico e o ódio lhes tira o senso de ridículo e eu acho ótimo. São muitas máscaras pra cair.

A solidariedade irrestrita é uma potência revolucionária. Há outras. E o trabalho interno, profundo, sincero e humilde é a primeira de todas as potências revolucionárias que possamos ter.



domingo, 30 de junho de 2013

Não tinha ninguém com medo ali - O registro de um dia eterno

Esse vídeo foi feito por Victor Belart, do Escafandro. Ele foi um dos autores do documentário "Escafandristas - cifrões, padrões e exceções", já publicado neste blogue.

Eu estava lá. Vi a "juntada" covarde no policial que caiu com uma pedrada. Era o último da fila, quando caiu os outros não viram. Desacordado, foi espancado por um monte de possessos, pelo menos dois insufladores à frente, convocando os demais. Infiltrados catalisando o ódio de grupos violentos, uns por ideologia, outros pelo massacre cotidiano, outros por índole violenta estimulada pela cultura midiática... não há como procurar culpas, numa análise ampla que procura profundidade. Culpar é ficar na superfície. Vergonha, sim, isso senti, ao ver a covardia insana, praticada nos moldes que o próprio sistema fabrica. Mas isso não ofusca a grandeza da movimentação, impressionante por si, rios e mares de gente que não acabava mais. Não é nenhum gigante acordando, como a globo criou até um personagem. É uma manifestação, um sacode de insatisfação com alguma tomada de consciência e muito descarrego de pressão.

Não dá pra concluir. As manifestações, desde então, continuam. Nos ataques do dia 20, sobre o milhão de pessoas que se manifestavam, nas perseguições movidas em todo o centro do Rio, com a polícia colocada em todos os pontos estratégicos e atacando com gases e balas de borracha qualquer ajuntamento de pessoas, que era só o que havia, grupos tentando fugir. Ataques policiais por todo lado, até no largo da Glória. Na Lapa, na Cinelândia, na Marechal Floriano, Presidente Vargas nem se fala, Campo de Santana, rua do Lavradio, Rio Branco, cheio de destacamentos policiais postados pra pegar todas as saídas da manifestação. Como disse um policial, era a vingança da polícia pelo espancamento do policial no dia 17. Estavam todos com aquilo atravessado na garganta.

Chamei os espancadores de possessos, mas pelo menos dois eu vi que estavam ali por encomenda, eles partiam pra cima dos policiais e voltavam conclamando os outros, que iam. Esses possessos não têm a menor consciência de que estão servindo aos interesses do sistema, em jogar uns contra os outros, em criar clima de conflito, espalhar o medo e justificar os ataques indiscriminados das forças de segurança às multidões que manifestam a inconformação com esse sistema que sacrifica a população pra beneficiar bancos e mega-empresários. Sistema muito bem montado nas costas do Estado.


segunda-feira, 24 de junho de 2013

Se eu pudesse falar com a esquerda...

 O texto abaixo se deve aos últimos acontecimentos, a rejeição dos partidos e bandeiras nas últimas manifestações, as infiltrações sujas nos movimentos, o "apoio" cooptador da mídia, esvaziando as propostas reais com uma quantidade enorme de propostas vazias. Enfim, velhas táticas de dispersão.


Confesso que estou pegando antipatia pela palavra fascista. É o insulto mais utilizado no momento pelos meus camaradas de esquerda, de todos os tipos e variantes que podem ser classificados assim – embora alguns poucos tenham a mesma postura intolerante, arrogante e agressiva dos fascistas. Agora qualquer um que esteja envolvido na bandeira do país é taxado de fascista. Qualquer rejeição aos partidos políticos é fascismo. Isso é uma redução simplória e capenga. Não é porque os fascistas se apegam neste e em outros símbolos “pátrios” que qualquer um com a bandeira faça parte desse grupo tão insignificante no meio da população tão vasta. Há quem use a bandeira por amor, os siglescos e partidários parecem não perceber a desideologização e os condicionamentos dominantes. Inclusive a rejeição à política e aos políticos.

Desde há muito tempo percebi a arrogância das esquerdas doutrinárias. Estava ainda na faculdade, em 1980 – ao entrar me encantei com as teorias esquerdistas, com os estudos que revelavam os porquês da pobreza, da miséria e apontavam caminhos pra superar essas condições –, participando dos debates, das discussões e de algumas ações de rua, meio espantado com a rivalidade entre grupos que discordavam, violentamente, se insultando por pensarem diferente, insultos pesados, morais. Sempre estranhei isso. Depois percebi a falta de penetração nas classes periféricas, o isolamento em que essas pessoas se colocavam, restritas às academias e às suas agremiações, o que fazia que manifestações de rua fossem vazias de gente comum, a esmagadora maioria, e me parecessem melancólicas, infrutíferas, sem nenhum resultado real de contaminação e mobilização do que chamavam de “as massas”. Aquele monte de bandeiras, palavras de ordem repetitivas, punhos erguidos – e as pessoas atravessavam a rua pra evitar o contato. Eram como clubes fechados, barulhentos e chatos. Os militares já agonizavam na gerência da ditadura e a mudança de fachada era iminente.

Eu aproveitava qualquer oportunidade pra viajar de carona, pras aldeias e povoados bonitos, cachoeiras e matas e praias, a descarregar e pensar minhas angústias da vida, num momento tão decisivo quanto o final da adolescência e o início da juventude – havia servido o exército dos 16 aos 17 anos. Não sabia o que fazer da vida e o que me ligava à universidade – estudava direito, mas não tinha o menor pendor nem pretendia ser advogado – era muito mais o sentimento de dívida com a família e o movimento estudantil efervescente, que já começava a me desencantar. Nos momentos de convívio com os mais pobres, percebia a distância entre aqueles “revolucionários” e a população. E o que tinha me parecido solução pras injustiças sociais foi se diluindo aos meus olhos. O grupo dominante na política estudantil, na época, era o PC do B, stalinista – na época. Mas havia uma constelação de agremiações e fui pulando de uma pra outra, sem nunca me filiar, encontrando sempre uma arrogância, uma intolerância, uma certeza religiosa de saber o caminho certo (o “único”), que me causava certa repulsa. Eu não tinha certeza de nada e me sentia desrespeitado a cada vez que não me deixava convencer por aquelas certezas e mantinha minhas dúvidas – as acusações e os insultos eram inevitáveis. Por fim, me refugiei entre os anarquistas, me sentindo mais respeitado, mas percebi que eles não respeitavam os outros grupos e os ridicularizavam e provocavam por sua vez, da mesma maneira ácida e insultuosa.

Com o esboço de consciência que já tinha da existência da enorme maioria despolitizada nas periferias, na pobreza, nas classes baixas e médias, constatei a esterilidade social dos universitários, sua distância da realidade popular – “por aí não vai”, concluí. Por esse e muitos outros motivos pessoais, larguei a escola, pus uma mochila nas costas e “sumi no mundo”, peguei a estrada. Aprendi artesanato e passei a viver nas periferias, vivendo nas ruas e estradas, morando em casebres de taipa, de palha, em pardieiros e puteiros, expondo meus trabalhos nas calçadas, nos bares da noite. Nestes, às vezes, encontrava pessoas daquele tipo engajado, com suas crenças, mas já não os levava a sério, onde eu vivia não se sentia seu cheiro, eram ausentes no meio do povo, restritos ao meio acadêmico, ao meio partidário, aos auditórios. Sentia agora, neles, preconceito, ingenuidade e a mesma arrogância de sempre, o que confirmava minha impressão de que, por ali, jamais viria uma revolução de verdade. Em minha própria arrogância, achava que se eles fizessem como eu e fossem viver em meio à pobreza, as “massas”, com humildade e espírito de serviço, haveria mais chance de conscientizar partes mais significativas da população e espalhar uma visão mais clara da nossa sociedade. Mas não, fechados em seus grupinhos socialmente insignificantes, discutiam e esbravejavam disputando qual o caminho pra “conduzir as massas”, numa ilusão a meu ver absurda e ingênua. Em seu sentimento de superioridade intelectual, não aprendiam as linguagens da população e esperavam que esta os seguisse, por algum motivo que não entendo até hoje. Com o tempo, percebi que eles também eram condicionados a terem medo das áreas pobres, das favelas, das periferias, por não as compreenderem, por não conhecerem seus códigos e costumes e pelo sentimento de superioridade intelectual, que também fragiliza. Como disse Darcy Ribeiro, em Confissões, há grandes e excelentes intelectuais analfabetos ou semi-alfabetizados - em outras palavras, mas isso mesmo (Confissões, pp 169).

Vivendo no meio dos despossuídos, sentindo em minha própria vivência as precariedades materiais, aprendendo, ávido, os valores espontâneos que brotam ali, os códigos de comunicação, o desenvolvimento intuitivo, percebi a profundidade da penetração do sistema com a força da mídia, alienando, distorcendo a visão de mundo, provocando sentimentos de inferioridade diante dos “ricos”, os mais bem vestidos, os de curso “superior”, que moravam em casas “boas” e tinham carro – um abismo intransponível. Apesar disso, fui crescendo em respeito pela força que eu via na sobrevivência, no dia a dia, na capacidade de superação de imensas dificuldades cotidianas, pelos saberes que passam despercebidos dos revolucionários de auditório e academia. Peguei antipatia daquelas bandeiras partidárias, dos gritos de ordem, dos punhos fechados, dos grupelhos intelectualizados cheios de soberba e sem nenhuma penetração no meio popular, afora algumas exceções insignificantes. Não era uma antipatia pessoal. A identidade da motivação - a inconformação diante da miséria, da exploração, das injustiças sociais - mantinha o afeto. Mas lamentava sua distância da maioria, achava um desperdício tanto conhecimento da realidade tão incapaz de se comunicar. E percebia, à minha volta, o sentimento de estranheza e repulsa com relação a esses mesmos grupos, que “falam uma língua que a gente não entende e chegam querendo mandar”. As raras vezes que via tentativas deles em se comunicar, era evidente a impossibilidade. Seu linguajar rebuscado – e creio que essa é a melhor forma de manter o conhecimento restrito a pequenos grupos, sem uma proibição formal – causavam imediato desinteresse na audiência já escassa. E eles se retiravam irritados com a falta de interesse da população, “muito ignorante e alienada”, voltando a se restringir às bolhas acadêmicas, sem questionar a própria incapacidade de serem entendidos. Estavam ali pra ensinar, como quem faz um favor. O orgulho cega.

Continua...

sexta-feira, 14 de junho de 2013

Demonstrações e agonia de um Estado cooptado que trai sua população


Olha essa chamada no feicebuque:
ATENÇÃO: Somos pacifistas, mas estamos unidos em solidariedade ao Passe Livre São Paulo. Dada a proximidade do nosso espaço ao centro da cidade, organizamos aqui na MATILHA CULTURAL um pequeno posto de atendimento de primeiros socorros, com enfermeiros voluntários, vinagre, curativos e água. Quem participar da manifestação e precisar de abrigo para se recuperar ou chamar ajuda, pode contar com a gente: Rua Rêgo Freitas, 542, pertinho da Igreja da Consolação/Praça Roosevelt. TAMO JUNTO! R$ 3,20 É UM ASSALTO! PEI!!!!”

A situação é clara, quando é preciso montar uma enfermaria de emergência antes de começar o movimento de protesto contra o aumento das passagens. O Estado está claramente contra a população, obediente aos seus sequestradores podres de ricos, os mesmos que, pra garantir seus privilégios, traem o povo brasileiro e o entregam como escravo à exploração do mesmo punhado de sempre, há dinastias. As forças de segurança, garras afiadas, cérebros lavados e enxaguados, “desarmava” os manifestantes que chegavam ou os prendia, se encontravam armas de defesa – vinagre, máscaras contra gases – ou de ataque – megafones, latas de tinta. Ninguém podia se defender dos ataques que eles programaram, das suas armas de gases e balas de borracha. Nada de manifestar o pensamento nos muros, nas paredes, em qualquer parte, já que nos negam o direito à voz.

A criminalização pela mídia, pelos poderes vigentes e pelos “gerentes” institucionais beiram o ridículo – seria cômico, não fosse criminosamente trágico o resultado dessas mentiras descaradas.

A mentalidade conservadora encontra respaldo nas tendências facistas da elite paulistana e seus admiradores, que demonstram seu ódio contra as mais que justas manifestações.

Notícias no mundo a respeito das manifestações em várias capitais brasileiras. Não se espere nada de bom da mídia nacional – exceção para as mídias alternativas, de pequeno porém crescente alcance.

A BBC Mundo, Brasil, destrincha o sistema de transporte coletivo brasileiro pra entender as manifestações populares. Não é mais contra o aumento, mas a favor da cidadania que o Estado nega à sua população. Está em español, não tenho tempo pra traduzir. Mas é língua irmã, fácil de ler e entender.

Abaixo a cobertura do Brasil de Fato, jornal independente dos poderes econômicos que tomaram o Estado e impõem a mídia comercial traidora do povo a serviço dos grandes vampiros.

São Paulo:
http://www.brasildefato.com.br/node/13233
Um passante relata o que viu e viveu. Atribui a responsa toda a Geraldo Alkmin. Eu já acho que se trata de uma marionete de luxo, funcionando a serviço do pequeno grupo de elite em Sampa - tá, vá lá, ele é um integrante. Mas o poder não está no governo, está bem acima, nos bastidores se vê o rabo.
http://ronaldobressane.com/2013/06/14/por-gentileza-tirem-geraldo-alckmin-do-poder/

Porto Alegre:

No Rio, a polícia disse que haviam 2 mil manifestantes. A foto demonstra a mentira.

Leonardo Sakamoto descreve bem os acontecimentos, suas raízes e suas consequências possíveis:

Mais barbárie e truculência. Já que os manifestantes não tomavam iniciativas que justificassem a agressão da polícia, ela mesma tomou a iniciativa e iniciou os tumultos, pra não perder a viagem. Minha solidariedade aos poucos policiais com humanidade e escrúpulos, esses que são desprezados e traídos pela própria corporação. Em geral sofrem tremendas angústias e acabam somatizando em problemas de saúde física ou psicológica, às vezes psiquiátrica. Seria preciso desfazer essa e construir outro tipo de polícia, que em suas instruções e formação tenham a base na cidadania, na inteligência, no respeito aos direitos do indivíduo e do povo como um todo, com base na Constituição Federal – que também precisa ser refeita, depois de tantos remendos (emendas) que a transformaram num livro de piadas de mau gosto, um franquestein constitucional. 

As forças de segurança são um elemento de base pra que a sociedade dominada por interesses empresariais cometa crimes continuados e progressivos contra a maioria da população. Olhaí:

O provocador vê um efeito colateral importantíssimo. Agora a luta é por uma pátria livre para todos:

A postagem do blogue Solidários, que merece ser conhecido e tem o meu respeito:

Controle biguebrodiano mundial
O controle se intensifica, a polícia fotografa, filma e marca as pessoas que se destacam nas manifestações – e não apenas os quebradores, os pequenos grupos que se divertem quebrando coisas e tocando fogo pelos caminhos. Essa é a cara atual das “políticas de segurança”, uma segurança contra o povo, procurando cabeças pra cortar, contando com o apoio judiciário na ridícula criminalização das pessoas que não se conformam com a barbárie imposta pelos bancos e mega-empresas através do Estado e das suas instituições infestadas pela influência das elites egoístas que desprezam a maioria apesar de viver às suas custas – aliás, por isso mesmo. O desprezo é o disfarce da sua fraqueza pessoal e dependência. Armados com o aparato “público” que roubaram ao público, sentem-se falsamente fortes ao fazer com que o povo seja brutalmente atacado por esse simulacro safado de democracia.
Os vazamentos de informações que denunciam as estratégias de infiltração, controle e repressão continuam acontecendo. Agentes a serviço da tirania que conseguiram preservar sua humanidade, quando descobrem os crimes a que estão servindo, iludidos por distorções da realidade, denunciam, apesar de saber das perseguições implacáveis de que serão alvos. Bradley Manning, soldado da inteligência estadunidense, confiante na mentira de que seu país defendia os povos que atacava, ao descobrir os inúmeros crimes de guerra e contra a humanidade ao que servia, divulgou as informações sobre esses crimes a Julian Assange, jornalista australiano criador do Wikileaks, que já publicou milhões de informações demonstrando o comportamento criminoso das potências ocidentais. Os dois são odiados pelo sistema, Manning há três anos preso entrou em julgamento agora, como traidor da pátria, passível de prisão perpétua ou mesmo pena de morte. Assange está asilado há dois anos na embaixada londrina do Equador, país pequeno e valente de Rafael Correa. E é ele quem denuncia o julgamento de Manning – no segundo link abaixo.

Mais recente, Edward Snowden, funcionário do sistema de informações estadunidense, denuncia o processo de espionagem irrestrito em implantação no planeta como um todo, vigiando como na profecia de George Orwell cada um e todo mundo, em seus telefonemas e comunicações em geral, na vida particular e em toda parte. Denunciou, largou tudo e foi pra China, literalmente, na esperança de durar mais tempo, ou mesmo conseguir viver. Abriu mão da própria vida, sabe que provavelmente nunca mais vai poder voltar ao convívio dos parentes e amigos, mas fez uma opção de consciência, diante da situação aterradora que viu sendo criada pra dominar e controlar os povos, por parte daquele punhado de vampiros planetários e seus cúmplices regionais, as elites locais.

O blogue anti-nova ordem mundial publica sobre a instalação do PRISM, denunciado por Edward Snowden:

No parlamento dominado pelos poucos podres de ricos, trama-se o enquadramento de manifestantes na lei anti-terrorismo que o império vem forçando pra impor aqui, com o apoio dos vampiros locais, cachorrinhos de estimação das corporações internacionais que tiranizam o mundo, seja massacrando com seu poderio militar, seja se infiltrando com sua falsa diplomacia e seu financiamento dos “políticos” e das políticas favoráveis aos seus interesses, sempre lesando os povos, saqueando recursos naturais e dinheiros públicos em claros crimes contra a humanidade, com pretextos claramente demagógicos e mentiras midiáticas. O projeto de lei está em pauta no parlamento que finge representar o povo brasileiro.
PL contra o “terrorismo”:

Remoções
Se houvesse alguma dúvida quanto à farsa dessa democracia fajuta em que se sabota, engana, rouba e reprime qualquer manifestação de defesa ou descontentamento da população, aqui está mais um procedimento onde fica bem clara a função imposta ao Estado, de servir aos ricos os sacrifícios do povo brasileiro. A hipocrisia é descarada. Mas estamos acordando, aos poucos. As manifestações são um sinal e a conscientização, o enraizamento das mudanças que não só são necessárias desde sempre, como estão se aproximando a olhos vistos. Daí o desespero e a violência induzida nas forças repressivas – não têm merecido a definição de “segurança pública”, pois defendem os interesses dos exploradores e atacam sua própria população –, mentes lavadas, brutalizadas, transformadas em usinas de ódio e brutalidade.

Junto com a copa das confederações, deprimente espetáculo de ostentação, consumo e alienação, começa a copa da cidadania, do esclarecimento, da contestação no estilo da alegria que não se deixa abater, debaixo das mais incríveis violências e injustiças. É a resistência sem limites que a maioria tem, debaixo dos condicionamentos de inferioridade imposta pela publicidade criminosa, como criminosas são as mensagens sub-liminares de todas as novelas, filmes e programas apresentados pela mídia privada, ainda esmagadora mas que perde espaço e crédito, em seu desespero raivoso com o andar das coisas. Os que pregavam o fim da história tentam bloquear, impotentes, as mudanças que vêm, inevitáveis, caminhando através da própria história. Estamos escrevendo, cada vez mais, com nossas próprias mãos.
Copa das comunidades ameaçadas de remoção:

observar e absorver

Aqui procuramos causar reflexão.