sexta-feira, 27 de abril de 2012

Comunidade Mauá, o anúncio de um novo Pinheirinho.

Prepara-se o aparato de segurança pública para cometer mais um crime social, mais um crime moral, mais um crime do Estado contra a nação brasileira, contra a população mais pobre desta nação, sua maioria. Mais uma vez se vê claro, a coisa pública imersa na privada, governos, legislaturas e magistraturas defendem os interesses econômicos de minorias ricas, empresários gananciosos e desumanos. Não preciso dizer muita coisa, os fatos falam por si. As campanhas eleitorais, financiadas por grandes empresários, são funcionários dos seus financiadores, em acertos feitos durante as campanhas, por exigência óbvia dos patrões.

Como acreditar em democracia? Nunca tivemos uma democracia, não sabemos o que é uma democracia. E esse papo de "redemocratização" é uma grande mentira. Os militares foram removidos do poder aparente para a construção de um cenário fajuto de democracia, que se desmente a cada ato do Estado e das suas instituições, a cada ano na sangria orçamentária para os cofres dos bancos internacionais de metade do orçamento que tem o destino desviado da sua função, os serviços públicos, para os tesouros acumulados dos verdadeiros ditadores das políticas públicas, um punhado de magnatas sub-humanos que se apropriaram de todos os meios que poderiam resolver os problemas da humanidade, para manter o controle sobre as sociedades e concentrar mais e mais poder, às custas do sofrimento das massas.

Está rolando um lento despertar, espalhado por aí, sob inúmeras formas. As mentiras, pouco a pouco, vão sendo reveladas, vão sendo percebidas, no ritmo do tempo, em evolução permanente. Que não se espere resultados plenos e rápidos. Participar do processo, de forma lúcida e persistente, já dá satisfação e sentido à vida. A caminhada se faz passo a passo. E, na minha opinião, começa dentro de cada um, pra depois se espalhar, com base no exemplo, nos valores, nos comportamentos - e não na posse da verdade, na definição de um único caminho, no arrebanhamento ideológico. Por aí, não vai e, quando foi, deu merda.

A arrogância dos revolucionários europeístas, seguidores invariáveis de pensamentos alheios, inutiliza ou, no mínimo, enfraquece suas ações, isola-os da população e os restringe a inexpressivas minorias, embora barulhentas - servindo apenas à composição do cenário falsamente democrático.

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Dia do índio é o cacete




Ontem, dia 19 de abril, chamado o “dia do índio”, não escrevi nada sobre o tema porque não existe dia do índio, desde que chegou aqui a civilização européia. Antes, como diz a música, todo dia era dia de índio.

Imagino o assombro com que a rapaziada viu surgirem as caravelas no horizonte, como enormes águas vivas, velas estufadas pelo vento, vindo em direção à praia, cada vez maiores, diante dos olhos espantados da tribo. Relatos escritos pelos europeus dão conta do espanto de índios e civilizados. Uns com a chegada daquelas enormes borboletas marinhas, cheias de brancos fedorentos e cobertos de panos, coisa incompreensível pra eles, naquele calor, outros com a existência de habitantes naquelas paragens desconhecidas, despidos homens e mulheres, uma vegetação nunca vista, com animais e frutos novos, costumes e línguas estranhas de parte a parte.

Os nativos não imaginavam a capacidade destrutiva dos europeus. Ali começavam os cinco séculos de violência, escravização, saque, expulsão e morte. Setenta milhões de habitantes das Américas foram sistematicamente exterminados e seus descendentes ainda são perseguidos até hoje, discriminados, difamados, saqueados, expulsos das terras que lhes restam.



Além da cobiça dos ricos latifundiários, mineradores e outros, os povos originários são perseguidos, a meu ver, por razões ideológicas. Numa sociedade centralizada no consumo e na produção, controlada por uns poucos e impregnada por valores falsos que transformam a vida num inferno, eles incomodam por evidenciar as mentiras nas quais estamos todos imersos. O indígena não vive para trabalhar, mas trabalha para viver e no que gosta. Quando chega da mata, trazendo caça, peixe ou frutos, não dá pra dizer se estava trabalhando ou se divertindo, porque para o índio, trabalho e diversão se misturam. Nós, civilizados, nos acostumamos à idéia do trabalho como um sacrifício a que todos estão obrigados. Assim fomos condicionados e poucos conseguem reagir a isso. Para nós, o mundo é uma competição desenfreada, um inferno de todos contra todos, conforme convém ao pequeno grupo dominante. O objetivo de acumular e de consumir, motor do inferno social, não existe para o índio. O que ele precisa, em seu estado natural, ele faz, não precisa comprar. Se ele precisa de uma casa, ele sabe fazer. Uma canoa, ele faz. Uma panela, uma rede, suas armas de caça, tudo ele sabe fazer, agasalho, remédios, tudo. Produz seu artesanato e pode muito bem viver de trocas, nos poucos produtos civilizados que lhe são úteis, como facões, machados e pouca coisa mais. O objetivo de vida dos índios não é juntar patrimônio, consumir à farta, disputar com seus irmãos quem pode usufruir de mais bens, dinheiro e poder. O objetivo da vida é viver.

Lembro de uma história, da época da vinda dos franceses (invasão francesa, nos livros de história) para disputar o pau-brasil com os portugueses, pois era uma mercadoria altamente lucrativa na Europa, sobre o diálogo entre um ancião tupinambá com um oficial francês, onde ele questionava tantos esforços, riscos e sofrimentos dos europeus para levar aquela madeira pelo mar afora. “Não há madeira lá pra vocês se aquecerem?” O oficial esclareceu que não era pra queimar, mas fazer tinta. “E pra quê é preciso tanta tinta?” O francês explicou que havia homens riquíssimos, que produziam mais tecidos, contas, espelhos e outras coisas em tamanha quantidade que o velho índio não poderia imaginar. E que um só comerciante riquíssimo desses poderia comprar vários navios cheios de pau-brasil. O índio não compreendia. “Mas esse homem riquíssimo de que você fala... ele não morre?” Morria, claro, como todos os outros. “E quando ele morre, o que se faz com o que ele juntou?” Fica para os descendentes dele, como herança, para que possam viver e estar garantidos. Então o índio balançou a cabeça, em reprovação, e afirmou que agora entendia que os europeus eram mesmo loucos. Se submeterem a tanto esforço, tanto risco, tanto sofrimento, a uma vida de sacrifício e dor, por um motivo daquele... não fazia sentido. “Nós também temos parentes de quem gostamos, as crianças nascem e crescem e nós sabemos que a mesma terra que nos alimentou, também os alimentará. Então, vivemos a vida com gosto, sem nos preocupar com coisas inúteis como essa e sem precisar sofrer tanto sem necessidade”.

Então, os povos originários são um péssimo exemplo para a população desinstruída e condicionada aos valores falsos que a sociedade nos impõe de forma tão tirânica, e ao mesmo tempo, insidiosa, que impede o questionamento. Por repelirem o sistema de trabalho empregado e rejeitarem a forma de vida civilizada, são chamados de vagabundos. Por suas áreas demarcadas ficarem fora do mercado de terras e do alcance da cobiça empresarial e latifundiária, execra-se e se impede de todas as maneiras a reparação aos crimes cometidos cotidianamente contra esses povos desde o nascimento do Brasil como o conhecemos, reconhecendo e demarcando suas terras de acordo com suas necessidades. O extermínio prossegue, massacre após massacre, enquanto a mídia defende os agressores e ataca as vítimas. Os patrões os odeiam, os grandes e ricos patrões que os vêem como obstáculos para seus lucros exagerados.

Deveríamos ver o tal “dia do índio” como o dia da vergonha. Não há progresso que se justifique com o sangue, o saque e a dor de tanta gente. O Estado e a nação brasileira, na pessoa de cada brasileiro, sobretudo nas autoridades, deve reparação aos descendentes atuais de inúmeras gerações, por mais de quinhentos anos, que foram escravizadas, perseguidas, dizimadas e saqueadas, com detalhada e esmerada crueldade. Descendentes que conservam, heroicamente, tradições e sabedorias ancestrais, depuradas ainda com sofrimentos atrozes no cotidiano, fruto do preconceito, da discriminação e da exclusão, que poderiam perfeitamente melhorar nossa sociedade, nossos costumes e nossas relações, tanto sociais quanto com a natureza.


25 de abril de 2012

Desumanidade e injustiça nos crimes do sul da Bahia contra os originários índios pataxós.


Nota de denuncia da comunidade Pataxó Hã-Hã-Hãe contra as policias Federal, Militar, Civil e fazendeiros.


É preciso fazer barulho, passar adiante, se manifestar, denunciar. Está acontecendo agora, a qualquer momento, enquanto comemos, enquanto dormimos, isso está acontecendo. Relatos documentados da covardia criminosa contra comunidades inteiras, famílias como as nossas famílias. O sentimento preconceituoso contra os índios - como qualquer preconceito contra qualquer coisa ou pessoa - só revela o nível primário de consciência. O sentimento de superioridade revela a inferioridade. A busca da igualdade plena - em direitos e deveres - é uma das mais nobres, difíceis e valiosas buscas da humanidade, no caminho da sabedoria e do conhecimento pleno, infinita estrada por onde todos nós andamos, a família humana entre tantas vidas universo afora.
Esse caminho passa pela consciência de que somos uma única família e existimos como tal.


terça-feira, 17 de abril de 2012

Argentina retoma o controle do seu petróleo - exemplo para o Brasil

O governo argentino enviou ao Congresso o projeto de reestatização da YPF, a Petrobrás da Argentina, que foi entregue por Carlos Menem, o FHC de lá, à REPSOL, petroleira privada espanhola, de graça e de bandeja, como foi a Vale do Rio Doce, a Usiminas, a Eletrobrás e todas as regionais, as empresas de telefonia, de água e esgoto e tantas outras. Assisti a leitura do projeto, emocionado e com um nó na garganta, orgulhoso de los hermanos.

Os lucros do petróleo estavam sendo exportados para uma Espanha, em franco naufrágio econômico, ocupada com as convulsões sociais provocadas pela tal austeridade imposta pelos agentes financeiros internacionais, com o sacrifícios de aposentadorias, pensões, empregos, serviços públicos em geral. Como sempre, o povo tem que pagar a conta desses demônios. Na Argentina, agora, 51% da petroleira pertence ao governo federal e 49% são divididos entre as províncias, que são como os nossos estados. (Há um engano aqui: foram reestatizados 51%, divididos entre o governo federal e os estados ou províncias. O resto continua com empresas privadas, que perderam o poder de mando.)

Cristina Kirschner, mulher corajosa, duramente perseguida, difamada e atacada pelo sistema Clarín (o sistema Globo da Argentina), colocou freios na mídia privada com a ley de medios, apesar da gritaria dos comentaristas e jornalistas mercenários de lá (como vemos aqui todos os dias). Aliás, a mídia daqui tá descendo o malho na presidente argentina, de todas as formas. Insinuações, comparações maldosas - Hugo Chávez de saias, disse uma voz suína -, a mesma nojeira de sempre.

E professores, como o coordenador do curso de jornalismo de São Borja, que me fez ouvir pérolas como "os grandes meios são, sim, o sustentáculo da democracia", numa palestra em que eu denunciava o jornalismo mercenário, desonesto, deformador da realidade que essas empresas praticam, aprovam esse jornalismo e o sonho dos alunos em ser parte desses esquemas cruéis e desonestos. Os gritos, assovios e aplausos, depois da minha resposta, o fizeram se retirar do auditório, furioso. Depois, submeteu o vice dele ao vexame de me esculhambar pelo tuíter, apesar do tal vice-coordenador nem ter ido lá, violando princípios jornalísticos e demonstrando que a defesa de interesses está acima da ética, do profissionalismo e até de regras básicas do jornalismo. Professores que encorajam seus alunos a ambicionar um lugar nessas empresas mau-caráter são elementos de manutenção dessa estrutura injusta, perversa, covarde e desumana. Estimulam o conflito e a competitividade egoísta, atiram uns contra os outros e deixam a verdade em segundo plano, pra ser usada apenas quando for conveniente - caso contrário, mente-se, tranqüilamente. O que vale é a grana, a fama, o "sucesso", não importa o custo moral.

Para esses criminosos morais, a Argentina cometeu pecados imperdoáveis. Estabeleceu o controle legal das empresas de comunicação - coisa que aqui não há, ou não funciona - e reestatizou o que as grandes empresas tinham levado de graça, com pagamento em falácias, papéis podres, títulos de dívidas e outras enrolações econômicas. Deles não se pode esperar outra coisa que reações raivosas, histéricas, ameaças e previsões catastróficas. Como aqui. Farinha do mesmo saco, mercenários da palavra, gente sem pátria ou nação em que se integrem, além dos privilégios obtidos na venda das suas consciências, servindo aos poderosos interesses desses menos de 1% que concentram os reais poderes sobre a sociedade, atacando tudo o que serve à coletividade, indiferentes ao sofrimento da maioria e hostis a qualquer tipo de solidariedade sem restrições, a qualquer tipo de sentimento de família humana.

Parabéns aos hermanos argentinos. Que seu exemplo nos sirva.


Está em espanhol e eu não sei colocar legendas.


Reações (20.04.12)
      Já era de se esperar as reações indignadas da legião defensora (e regiamente paga pra isso) dos interesses empresariais. Entidades representantes da população européia falam em retaliações e defendem explicitamente os interesses mega-empresariais da multinacional expropriada. Jornalistas e comentaristas do mundo todo caem sobre o assunto com mordacidade, com fúria, ironias e deboches pesados, Cristina La Loca, Hugo Chávez de saias (aproveitando o trabalho midiático bem-sucedido de demonização do presidente venezuelano, apresentado descaradamente como ditador, em contradição com os mais de dez pleitos passados por ele, entre eleições, reeleições, referendos e plebiscitos - pelos mesmos motivos, ou seja, conter as grandes empresas no avanço sobre os direitos das populações e colocar o Estado a serviço do seu povo como um todo) e por aí vai, contando com retaliações contra a Argentina.
      A Argentina tem um histórico interessante neste sentido. Até o ano 2000 sua política econômica era apontada como exemplo pro resto da América Latina, privatizando tudo o que era público, desmontando a rede ferroviária, destruindo os direitos trabalhistas, atrelando o país numa dívida externa (que, depois dos processos "globalizantes", mudou o nome pra dívida pública - estratégia marqueteira) e se pondo de joelhos, a pagar juros que só aumentam e uma dívida que não diminui. Então, o país quebrou, o povo foi à miséria generalizada, como era de se esperar, e se levantou, que argentino zangado é brigão, mesmo. Em duas semanas foram derrubados vários presidentes pelo movimento "que se vayan todos" (ver o filme Memória do Saque - Memoria del Saqueo -, de Fernando Solanas, produção franco-suiça-argentina) e foi eleito, pela primeira vez, Néstor Kirshner. Com o povo nas ruas, em levante permanente, as grandes empresas foram acuadas e reduziram seu espaço de manobra, mantendo o poder sobre as comunicações, com a mídia privada já meio desmoralizada - o Clarín é a Globo de lá. E o governo pôde começar a fazer mudanças a favor da população, bem aos poucos. Néstor foi eleito, reeleito e, depois, Cristina Kirshner continuou o processo, firme e feminina, na direção de uma sociedade que não abandone nenhuma parcela da sua população.
      Os privilegiados se revoltam, se agitam, a mídia esbraveja, difama, distorce, conclama à revolta e à derrubada da presidente. Mas ela, com movimentos corajosos de mestre, praticamente anula o poder das minorias ricas que controlavam as políticas públicas, a serviço dos exploradores estrangeiros. Investe na tv pública e esta se torna referência para a população, desfazendo as mentiras das tvs privadas, que urram contra o ataque à "liberdade de imprensa", termo sempre usado pela mídia pra defender sua liberdade de mentir sem ser desmentida. Une seu país ao movimento de união dos países latinoamericanos, fortalecendo a resistência aos abusos das grandes multinacionais representadas por seus governos dos países do chamado primeiro mundo - primeiro, claro, às nossas custas históricas. Seus governos melhoram as condições de vida do povo e, enquanto pela mídia privada internacional a presidente Cristina é difamada, o povo argentino a apóia em massa - fórmula infalível para a continuidade do processo.
      Eu fico até constrangido com esses pseudo-brasileiros privilegiados da mídia, os tais jornalistas e comentaristas e suas expressões fisionômicas sempre falseadas, aos meus olhos, combatendo os hermanos latinoamericanos, bolivianos, venezuelanos, nicaragüenses, equatorianos, que passam por processos de descolonização política e econômica e levantam sua cabeça diante dos impérios corporativos mundiais. Em sua subalternidade ideológica, cultural, moral e quantas outras abjeções, esses profissionais da mentira e da distorção trabalham para difamar, desvalorizar e ridicularizar os processos de libertação dessas amarras seculares, em favor dos que consideram as divindades do mundo, os donos das corporações estadunidenses e européias, acostumados a escravizar, explorar e saquear povos no mundo inteiro, como que por direito de nascimento, como os reis da antigüidade.
      Segue o processo.

Recebi interessante reportagem de Eduardo Febbro, de Paris, em boletim de notícias da Carta Maior, em 20.04.12, nesse link - http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=19996&boletim_id=1172&componente_id=18772

Ricos e Pobres




        A falsificação da realidade, trabalho feito com sucesso pela mídia privada, desde sempre, é cada vez mais descarada. A prática política se utiliza dessa mesma estratégia, criando títulos bonitos para ações horrorosas. Um desrespeito à inteligência, um cinismo criminoso.
     O prefeito recém empossado que teve sua campanha eleitoral patrocinada, em grande parte, por empresas imobiliárias, anuncia a remoção de “comunidades pobres”, segundo ele, para livrá-las dos riscos de desabamentos. A lista, provavelmente feita pelas empresas como condição de patrocínio à campanha, inclui as áreas valorizadas pelo mercado imobiliário cobiçada pelos olhos grandes dos empresários.
        Uma barreira visual é construída ao longo da Linha Vermelha para esconder o complexo de favelas da Maré dos olhos dos gringos e visitantes que vão do aeroporto internacional para o centro e zona sul da cidade. O motivo alegado é proteger as frágeis orelhinhas dos moradores do ruído produzido pela via expressa. A ironia é automática, a raiva, inevitável. Até as palavras são torcidas, deformadas, torturadas.
       Como diz Gizele Martins, moradora da Maré, chamar favela de comunidade pobre é o mesmo que chamar um negro de moreninho.
      Favela é comunidade roubada. Em direitos, em cidadania, em humanidade.
         Morador de rua não existe, o que existe são desabrigados.
      Flexibilização é destruição de direitos trabalhistas, é violação de leis.
       Revitalização é expulsão de pobres que se abrigaram em prédios abandonados - devolvendo-os à situação de desabrigados - para ceder os espaços valorizados pela especulação imobiliária a meia dúzia de empresários ricos.
        Segurança pública é repressão e contenção do público.
        Emprego, em geral, é exploração até o talo, é destruição de qualquer qualidade de vida.
        Transporte público é tortura e aviltamento.
       Pessoas que se manifestam para conseguir respeito aos seus direitos constitucionais, permanentemente negados por um Estado que não cumpre sua própria constituição, são classificadas de baderneiras. As ordeiras são as que se conformam, se calam e sofrem sem reclamar, numa depressão silenciosa. “Morram quietos, pobres, mesmo vivos”, é o que nos diz o sistema social dominado pelos ricos mega-empresários, os que têm os políticos no bolso.
        O Estado tem sido um robinhude ao contrário, rouba dos pobres pra dar aos ricos.
Democracia é um cenário fajuto, cada vez mais esfarrapado – democracia de verdade é um povo alimentado, instruído, informado e consciente, tomando decisões a seu próprio respeito. Senão, é a “cracia do demo” e nada mais. Nunca tivemos democracia, só fachada e ilusão.
        Os pobres constróem, mantêm, fazem funcionar e ainda sustentam, via impostos, toda a sociedade. E são desprezados, sabotados, enganados, roubados, explorados, controlados, reprimidos e violentados, cotidianamente. O sentimento de inferioridade e impotência plantado há gerações, pela ideologia midiática e sua máquina de fazer opinião e distorcer a realidade, não deixam perceber a força enorme que a maioria possui. Afinal, quem planta o que se come? Quem carrega as caixas, faz o transporte e prepara a comida? Quem abre as portas, prepara os ambientes, faz a limpeza, tira o lixo? Quem cuida das crianças, dos carros, das casas, dos animais? Quem conserta vazamentos, fiações, quem instala os canos, levanta as paredes? Quem está na linha de montagem do que quer que seja que se fabrique? Quem corta os tecidos e costura as roupas? Quem desce aos subsolos dos gases, fiações e tubos, desentope os entupimentos, conserta os vazamentos? Quem instala as torres de transmissão, seja de comunicações, seja de transmissão de energia? Quem se pendura nas alturas pra todo tipo de risco? Quem viabiliza a existência da sociedade são os pobres.

        O empresário rico diz que “dá empregos” quando, na verdade, tira sua riqueza, seus privilégios, seu luxo e ostentação da exploração dos seus empregados, pagando o mínimo possível e violando direitos trabalhistas. Um rico é uma ilha de arrogância cercada de pobres por todos os lados. Um pobre é a base inconsciente de toda a estrutura. Um pobre pode viver sem ricos. Um rico não pode viver sem pobres.

Muito fácil perceber que sem os ricos a sociedade seria menos injusta e perversa. E que, sem os pobres, ela seria simplesmente impossível.

Alguns dizem ser restrita e preconceituosa a visão da sociedade dividida entre ricos e pobres. É certo, há muitos patamares, tanto na pobreza, quanto na riqueza, inclusive com a importante classe média dividida em degraus – costumo falar no plural, classes médias, que vão do gerente de loja, do sargento ou do mestre de obras ao diretor de grande empresa, ao general ou ao engenheiro-chefe. Mas é impossível não considerar o contraste brutal entre a parte de baixo e a parte de cima. Embaixo, carências, desrespeitos, dificuldades de sobrevivência assolam mais da metade das pessoas. Em cima, luxos, desperdícios, ostentações e usufrutos que ofendem a sensibilidade de quem a tem. Quem está na parte de baixo, como eu, vê a parte de cima como um bloco homogêneo, arrogante e privilegiado, digno do respeito e consideração pelo poder público, muito ao contrário de nós. As diferenças internas de classe, dessa forma, são irrelevantes. Ricos são os que têm mais do que precisam pra viver, pobres são os que têm menos. Simplifico porque no fim das complexidades, a coisa é bem simples. Não há uma fronteira clara entre as classes, mas os extremos contrastam dolorosamente. É aí que a sociedade se apresenta dividida entre ricos e pobres, apesar dos intermediários que podem chegar a 30% da população, variando a quantidade e a qualidade dos privilégios, mas tendo em comum os direitos respeitados, pelo menos os básicos. Só a informação foge a esta regra, pois é distorcida sem preconceito, para todos.
Afinal de contas, pior que a pobreza de grana é a pobreza de espírito. E essa não depende da classe social, embora prevaleça entre os mais ricos. Para usufruir de privilégios sem incômodos de consciência, é preciso empobrecer a alma, acreditar em mentiras crassas e criar indiferença ao sofrimento cotidiano de milhões.
        Para haver respeito aos direitos fundamentais desses milhões, é preciso exterminar esses privilégios materiais, instrucionais e informacionais, privilégios grosseiros e desumanos, apresentados com orgulho quando, na verdade, são uma vergonha.

segunda-feira, 9 de abril de 2012

A coisa anda a passo de tartaruga


Polícia grega a serviço dos bancos, ataca a população em protesto, começando pelos jornalistas.
Polícia grega ataca jornalistas, manifestantes e a população em protesto contra as leis impostas pelos bancos ao país, sacrificando aposentadorias, ensino, saúde e direitos trabalhistas. É a demonstração do controle dos Estados pelos poderes econômicos mundiais, que além de financeiros são, em último caso, militares e sanguinários.


      Para dar aspecto de adesão aos três tratados “anti-corrupção” internacionais assinados pelo governo brasileiro, este enviou ao congresso uma lei que, agora, está sob exame de uma comissão especial na câmara dos deputados.
      Mais uma lei de fachada, mais um instrumento pra ser utilizado em “brigas de cachorro grande”, as disputas entre elementos das elites, única maneira de ver podres vindo à tona e privilégios sendo retirados, em uma dança das cadeiras falcatruesco que não modifica as estruturas altamente corruptas que sustentam o cenário “democrático”.


      De minha parte, não tenho como acreditar na eficiência de tal lei – que ainda não foi aprovada e talvez não seja –, enquanto à minha volta empresas são constantemente favorecidas em prejuízo do público. Quando vejo a situação dos transportes, aqui no Rio de Janeiro – esfregada em nossa cara pelo menos duas vezes por dia –, ônibus superlotados, parados nos congestionamentos, metrôs apinhados, abafados, quebrando no meio do caminho, gente passando mal, sem ar, empurra-empurras, lotações esgotadas em trens, nas barcas, os serviços rotineiramente desrespeitosos, como o deboche das tarifas absurdas – onde, no mundo, trens, metrôs e barcas têm passagens mais caras que os ônibus? – e dos cartazes publicitários afirmando o cuidado e o amor aos passageiros, como se o serviço fosse a principal preocupação desses empresários do setor, e não o lucro a qualquer custo.
      O financiamento das campanhas é o foco e a manutenção dos bonecos políticos sob o controle empresarial. Pelo menos o foco principal e mais perceptível. A promiscuidade escancarada entre os políticos e os empresários deixa bem claro a quem serve a chamada “representação pública”, que de pública só tem o nome e o poder sobre o aparato estatal onde quem menos apita é o próprio público.
      O “avanço” que vejo é o fato de se estar falando em corruptor. Sempre me incomodou demais os ataques aos corruptos políticos, sem menção aos seus patrões, os mega-empresários que determinam políticas públicas, sem serem eleitos. Há muito tempo as decisões são tomadas de um círculo acima da política, no escuro dos bastidores. Manifestações “contra a corrupção” que terminam em acusações ao congresso ou a elementos de câmaras legislativas me parecem superficiais, cosméticas, infantis e passam longe das causas da corrupção tradicionalíssima nos poderes públicos das falsas democracias do empresarismo neo-liberal – o “capitalismo” sem cabeça nem nome de que falam as “esquerdas revolucionárias” arrogantes e elitistas.
      Pouco a pouco (e, meu deus, como é pouquíssimo!) se percebe que as causas da barbárie social que se alastra pelo mundo – atualmente “terceiromundizando” a Europa, começando, como sempre, pelos mais pobres – têm suas causas mais acima que a política das marionetes, no escuro dos mercados financeiros, no alto da pirâmide social, entre os riquíssimos a quem interessa manter a população ignorante e desinformada para seguir controlando seus fantoches e determinando as ações e omissões dos poderes públicos – que, de públicos, só têm o nome.
      Não sei quantos passos falta nessa direção, pra se começar a perceber que essa preponderância do poder privado se infiltrou na mentalidade, nos valores sociais e pessoais, produzindo opiniões, objetivos, desejos, modos de vida, comportamentos que sustentam, alimentam e mantêm essa estrutura social. O atrelamento do ensino aos interesses empresariais infestou as escolas e academias, aumentando o abismo entre as classes e desenvolvendo o egoísmo, a arrogância e a competitividade ao extremo, criando indiferença com relação à miséria, à pobreza e à exploração como se fossem mazelas inevitáveis, ao invés de vergonhas inaceitáveis.

      Os acontecimentos na Grécia deixam escancarado os mecanismos de ação e servidão dos governos “democráticos” submetidos à ditadura do “mercado financeiro”- representado hoje pelo que os gregos chamam “tróika”, a trinca Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional e Mercado Comum Europeu. Quem determina realmente as políticas públicas passa longe de eleições.


      O poder empresarial é desumano e não poderia ser de outra forma, pois seus objetivos se reduzem ao maior lucro e ao menor custo, como uma lei imutável e natural do nosso sistema social, o sistema que aceitamos como único possível e sem possibilidade de mudanças além da superfície e que sustentamos com nossos valores e comportamentos – que foram criados em laboratórios multinacionais e impostos, basicamente, pela mídia, como demonstrou Milton Santos no filme do Silvio Tendler, “Conversas com Milton Santos – a globalização vista pelo lado de cá”.


      Ainda nas palavras do brilhante negão, as empresas não têm nenhuma responsabilidade social, nenhuma responsabilidade moral, nem mesmo territorial, pois o centro do seu interesse é o lucro – a qualquer custo.
      Não consegui colocar o nome de nenhuma dessas marcas famosas, acompanhado das palavras “trabalho escravo”, no gúgol, sem obter resultados. Todos o nomes, náique, adidas, zara, marisa, etc, deram resultados, flagrantes ou denúncias de trabalho escravo, de exploração de crianças, em qualquer parte do mundo. E nós, boçais e ignorantes, vendo as marcas como nos foi programando, como símbolos de qualidade e até de afirmação de valor social. “Estupidezes” alienadas, condicionadas, como se vê em qualquer pesquisa em saites como o do Repórter Brasil.


      Precisamos deixar de ser otários e parar de colaborar com esse estado de coisas, precisamos levantar quais são realmente os nossos valores e quais foram implantados pela competência da publicidade, sobretudo depois do advento da psicologia do inconsciente aplicada à criação de valores e comportamentos sociais. Um processo criminoso e desumano que se vê no documentário “O século do ego”, produzido pela BBC de Londres e já divulgado neste blogue. Estamos todos impregnados, em maior ou menor grau. Quem se pretender isento passa atestado de ingenuidade, pra dizer o mínimo. E é por isso que os trabalhos de mudanças na estrutura social para colocar finalmente o Estado a serviço do seu povo precisam começar internamente pra adquirir consistência externa, poder de contágio e propagação. Não é uma figura de linguagem a afirmação de que mudando a si mesmo é que se muda o mundo. É uma necessidade.
      Sem isso, qualquer papo sobre revolução é inconsistente, não passa de teoria ou simples conversa fiada.

domingo, 1 de abril de 2012

Quando 31 de março foi 1º de abril

Por volta das quatro da madrugada as tropas do exército, com tanques, armamentos, caminhões lotados de soldados, jipes, caminhonetes, canhões e todo o aparato de guerra, partiram de Minas com direção ao Rio. Era o dia 1º de abril e um golpe era iniciado contra o governo eleito de João Goulart, golpe gestado desde a época de Getúlio, inclusive com um “manifesto dos coronéis”, e abortado –ou adiado – pelo suicídio estratégico do próprio Getúlio. Dez anos depois, quando os coronéis já estavam generais, deu-se o golpe. Tinha a cara, as mãos e as armas militares, mas – 1º de abril! – a cabeça era empresarial – mega-empresarial multinacional, pra ser mais exato. Um embaixador estadunidense era a mola propulsora e a correia de transmissão.
João Goulart seguia a linha de Getúlio que, em seu governo nacionalista, contrariou determinações dos “patrões” estrangeiros. Gegê estabeleceu o ensino obrigatório, criou leis trabalhistas, fez investigar a dívida externa, que caiu em 40%, entre outras coisas, ameaçou simpatias ao regime nazista e conseguiu, com muito jogo de cintura, fundar a Companhia Siderúrgica Nacional, a Petrobrás e outras estatais que os industriais do crescente império estadunidense proibiam por vias tortas. Claro, ele era um latifundiário populista, membro da elite, que conquistou o povo com seu paternalismo, mas suas atitudes criaram condições pra que a população mais pobre começasse a entender como funcionava a sociedade. As associações, sindicatos, federações de trabalhadores ganharam uma força nunca vista e, quando Jango chegou à presidência, encontrou apoio suficiente pra encarar as elites e começar as tais “reformas de base”. Apoiou os movimentos dos trabalhadores, aumentou em 100% o salário mínimo, enfurecendo os patrões e as elites nacionais e assustando os internacionais, em plena época de guerra fria, onde o comunismo era uma ameaça terrificante. Sacrilégio dos sacrilégios, desapropriou as terras em torno das rodovias e ferrovias federais, até dez quilômetros de distância de cada lado, e decretou a reforma agrária. Essa foi a gota d’água e o golpe foi dado. Ou eles perderiam o Brasil do seu controle, como haviam perdido Cuba, poucos anos antes, e temiam perder seus “quintais” na América Latina, entre os quais o Brasil era o mais rico e importante.


Para continuar o texto, clique no link abaixo. No final, documentário.

observar e absorver

Aqui procuramos causar reflexão.