sexta-feira, 28 de março de 2025

Aos acolhedores, profissionais ou não.

No trato com desabrigados* é comum a visão geral, externa e impessoal. Eu mesmo, originário de classe média, via o povo “da rua” como um bloco homogêneo, de fora, sem perceber as particularidades pessoais. Uma realidade estranha, desconhecida, assustadora, desconfortável de ver. Apenas quando vivi entre eles, sendo um deles, é que percebi a imensa riqueza de variações, temperamentos, visões de mundo, caráter, sentimentos, temperamentos e, sobretudo, de histórias.

Parece difícil levar em conta que cada um ali, em situação de miséria e abandono, foi um recém-nascido, uma criança que passou por todas as idades até se tornar adulto, por incontáveis experiências, vivências e acontecimentos nas relações pessoais e com a sociedade. É preciso individualizar e levantar cada história, percorrendo o caminho até chegar na situação do desabrigo - e suas conseqüências.

De que maneira a pessoa chegou ao mundo, como foi recebida pela sociedade, quais as referências que ela teve na sua formação até a idade em que está? Que configuração familiar ela encontrou? Quais os contatos e de que qualidade ela teve com as instituições - polícia, medicina, escola, vizinhança… -, como foi formada sua visão de mundo e seu sentimento na coletividade social? Quantas situações e acontecimentos traumáticos aconteceram na sua vida?

É preciso levantar a história de vida de cada um, individualizando e ajustando o trato a cada personalidade e contexto, percebendo também os crimes que a própria sociedade cometeu e comete cotidianamente contra essas pessoas, sempre vistas como sub-humanas, inferiores, incômodas, expulsáveis, repugnantes e perigosas, em vez de serem vistas como são, roubadas em seus direitos, excluídas dos benefícios da tecnologia e da sociedade em geral, destinadas, quando muito, aos piores trabalhos, mais sacrificados e de menor remuneração.

Entre os desabrigados, famintos, desprezados, repelidos, agredidos, alguns caminham pro crime, que está sempre por ali, convidando de inúmeras maneiras, da “camaradagem” eventual às grandes empresas do crime.

Outros buscam anestésico nos alteradores de consciência, entre o álcool e outras drogas que trazem momentos de alívio, de paz, alegria ou esquecimento da realidade. A dependência chega como conseqüência. Ali está o acolhimento que a sociedade negou, o conforto que nunca houve, a anestesia momentânea pras dores da vida. É preciso compreender primeiro esta situação, quando o objetivo é o resgate.

Respeito verdadeiro, solidariedade sincera, humildade, sensibilidade e calma são ferramentas valiosas nesse trabalho. A conversa franca, a escuta interessada, a compreensão sem julgamentos são caminhos afetivos na criação, no despertar da vontade de receber ajuda e mudar a situação.

 

 * não gosto da expressão “morador de rua”, que parece estabilizar ou normalizar a situação de desabrigo, um crime constitucional (artigo 6º) praticado pelo Estado contra sua própria população - desde sua fundação por europeus. Por isso prefiro “desabrigado”, palavra mais clara que denuncia a omissão da sociedade no cumprimento da chamada “lei magna”, a base da formação do Estado.

sábado, 8 de março de 2025

O problema é estrutural - não é nenhum governo, mas a estrutura social.

Os governos têm sua personalidade, seu estilo e suas intenções que variam entre si. Mas nenhum governo criou a corrupção, não se elimina a corrupção derrubando um governo. Isso é uma distorção da realidade estratégica pra esconder os responsáveis pela perversidade social que cria miséria, desabrigo, fome, doenças, injustiças e sofrimento na vida de milhões e milhões de pessoas, pra falar só do Brasil. No mundo todo, ou quase todo, é a mesma coisa. Um punhado de podres de ricos pisando nos povos.

A estrutura social foi construída pra ser corrupta, corrompida e corruptora, porque isso favorece o controle pelos poderes econômicos. Todos os governos convivem com isso, mas quando algum se dispõe a servir também os de baixo, a mídia berra "corrupção, corrupção, corrupção!!", junto com os corruptores e os corruptos - podres de ricos e seus representantes institucionais, como tantos nos poderes públicos), porque não se pode derrubar um governo alegando que ele tá servindo aos mais pobres, os explorados do sistema, roubados em seus direitos constitucionais - seria muito descaramento. A corrupção é um coringa para os podres de ricos derrubarem governos que escapam do seu controle.

À medida em que for sendo enxergada essa estrutura, ela vai sendo modificada. Daí o esforço em manter o povo cego, iludido, enganado, desinstruído e desinformado. O esquema social é diabólico e fala em Deus, pra se manter como é, sem modificações, transformando as injustiças e os crimes de Estado contra o povo em "castigo divino". Assim se desvia a atenção das verdadeiras causas sociais e se impõe a responsabilidade (culpa) sobre as vítimas.

O que são privilégios?

 O Zé Jorge falou que "é muito difícil alguém abrir mão dos privilégios da sociedade opressora, para defender a sociedade dos oprimidos , como o Eduardo Marinho, sabendo ainda que, muitos desses oprimidos sustentam esses opressores."

Não é tão difícil quando se percebe que esses "privilégios", na verdade, são resultado das injustiças e dos crimes sociais contra a população. Há incomparavelmente muito mais oprimidos do que opressores, o que faria mais exato dizer "sociedade oprimida" sob "poderes opressores" de um punhado de podres de ricos, parasitas sociais e controladores do Estado e das comunicações. De qualquer forma, minha atitude não foi pra "defender a sociedade dos oprimidos", mas sim conhecer o chão, a base, os alicerces da sociedade - de dentro, porque de fora só se vê a superfície e qualquer impressão é pouca. Em meio à pobreza e ao submundo, percebi uma riqueza imensa e, até então, desconhecida. Do tipo que se pode distribuir sem nunca acabar, do tipo que se leva da vida, quando ela acaba. Aí estão os privilégios verdadeiros, que satisfazem a alma, e não o ego - diante de uma visão de mundo onde se vale o que se tem, ou o que se ostenta.
Por fim, os "oprimidos" que "sustentam esses opressores" não têm seus direitos respeitados, sobretudo na formação humana, de senso crítico e auto-estima, e nas informações do jornalismo mercenário, pra perceberem o que estão fazendo. Culpar as vítimas, quando não é uma estratégia de distorção da realidade, é uma arrogância de superfície que cega os olhos da percepção verdadeira - o que, aliás, é muito mais cômodo pra encerrar o assunto e mudar o foco pra assuntos mais agradáveis, embora longe de entender o funcionamento desta sociedade injusta, perversa e covarde em sua estrutura.
Há quem prefira pensar no carnaval, no seu time de futebol, nos entretenimentos dispersivos, no seu "hobby" ou em qualquer assunto mais superficial. Isso é estar de acordo com as induções programadas que desviam a atenção das raízes das mazelas sociais.

sexta-feira, 7 de março de 2025

Piscininha de crianças, superficialidade total.

 Durante o governo Lula fui chamado de bolsonarista, por críticas a construção de Belo Monte, atropelando os Kayapós, e pelas obras da copa e das olimpíadas, que expulsaram cerca de 250 famílias das suas casas, no Brasil inteiro, na base do ataque policial, com bombas, gás lacrimogêneo e porrada. Agora sou chamado de "defensor" do Lula por mencionar as evidentes falcatruas no julgamento e nas reais intenções do golpe - desmantelamento das empresas que ganhavam concorrência das estadunidenses (construção pesada), das indústrias naval e de tecnologia, na lava-jato que, na verdade, usou a "corrupção" como pretexto mentiroso, empregando traidores da nação comprados por fortunas. O Brasil foi reduzido a exportador de matérias-primas, a produção de conhecimento foi perseguida e enquadrada, cientistas saíram do país aos magotes, professores de história e geografia foram encurralados e perseguidos, em sintoma claro de criação de mais ignorância. Acusadores dos dois lados brincam em piscininhas de crianças, com sua mentalidade superficial. O ódio não faz parte do meu cardápio de sentimentos, mas essas pessoas são incapazes de assimilar isso. Nem acreditam, porque alimentam ódios e destrutividade contra seus "inimigos" (eles não têm adversários ideológicos, mas inimigos a serem eliminados, como na mentalidade nazista da segunda guerra mundial. Eu teria vergonha de ter uma visão tão superficial e tão claramente induzida ao conflito - que evita o aprofundamento das análises. Não brinco em piscininha de crianças. E essa história de "dois lados" mantém a superficialidade das discussões. Há inúmeros lados que as comunicações empresariais dominantes escondem. Pros interesses econômicos, o conflito e a superficialidade mental são uma necessidade pra manter o domínio sobre as instituições e a política partidária. Há muito mais política do que partidos, mas a ignorância programada não consegue ver.

observar e absorver

Aqui procuramos causar reflexão.