segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

O primeiro vídeo...

Depois de trinta anos de trabalho na rua, dizendo o que penso, o que sinto e o que vejo no meu trabalho, apareceu a câmera de Rona e Arley, gravando os assuntos e a exposição.
https://www.youtube.com/watch?v=eiGZnYEnQoc

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

A população caminha para a própria consciência
Por uma sociedade menos injusta, mais igualitária, menos perversa e mais solidária.
É preciso igualdade de condições, em acessos e oportunidades, em direitos e obrigações. É preciso prioridade à infância, à velhice e a toda situação de fragilidade. 
É preciso uma distribuição mais igualitária de riquezas e trabalho, de benefícios e sacrifícios no planeta.
Apesar das diferenças, caminhamos, todos, na mesma direção.

terça-feira, 11 de agosto de 2009



Invasão de Favela - acrílica sobre tela, 68x100cm, 2007










Trabalho executado sob forte comoção, durante uma série de operações policiais em várias comunidades pobres. Na ocasião, mais de uma centena de pessoas foram mortas, todas sob alegação policial de resistência, grande parte delas sem nenhum envolvimento com atividades criminosas. O aparato de segurança do Estado é atirado contra a população das favelas, enquanto a mídia criminaliza a pobreza cotidianamente, ligando a pobreza ao tráfico de drogas, à bandidagem e à violência, sem lembrar a omissão do próprio Estado em relação às populações em áreas de exclusão social, onde faltam saneamento básico, escolas que ensinem de verdade, condições de formação profissional, atendimento de saúde com recursos e qualidade, noção de cidadania, informações, urbanidade.
Durante essas operações, milhões de pessoas vivem o inferno da conflagração, tiros de fuzil varando paredes, atingindo qualquer um, homens, mulheres, crianças, idosos. O medo de ter familiares e amigos mortos ou feridos é uma constante absurda, o pavor na hora de ir à escola e ao trabalho, o temor dos que ficam em casa esperando a volta dos que saíram, o coração aos saltos ao ouvir tiros nestes horários, mais que em outros, é uma injustiça imperdoável com essa coletividade já tão sacrificada.
Senhoras se juntam em orações para que Deus proteja seus filhos e netos, senhores silenciosos permanecem com olhares sombrios, calados e ausentes. A polícia invade essas áreas entrando em qualquer casa, de armas apontadas, escorados no instrumento jurídico "mandato de busca coletivo", criado especialmente para comunidades pobres. Nestas ocasiões, um espirro pode decretar a morte de alguém, pois os policiais estão em estado de tensão máxima e atiram sob qualquer pretexto, pois estão entre o risco de morrer ou ser baleado e a garantia da impunidade, em caso de engano e envolvimento de inocentes. Afinal, são "apenas favelados", sem recursos para buscarem direitos. O histórico de mortes de crianças, adolescentes e jovens é avassalador, embora ignorado pela mídia, e faz pensar em processo de extermínio intencional de pobres, já que os verdadeiros donos do tráfico de drogas e do crime organizado estão longe das favelas, têm empresas legalizadas e transitam facilmente entre os poderes constituídos, em ligações com políticos e autoridades do Estado e gozando de todos os privilégios das elites. A grande maioria das favelas nada tem a ver com o crime, embora seja obrigada a conviver com armas e o tráfico que, na ausência do Estado, impõe suas leis a essas comunidades abandonadas à própria sorte. Ali, só se conhece ações do governo pelo seu braço armado, pela repressão.
Esta pintura é expressão de solidariedade do autor com essa massa de pessoas sabotada, excluída, empobrecida e criminalizada por um Estado feito refém de elites, das grandes empresas nacionais e multinacionais, posto a seu serviço, contra a maioria de sua população, roubada em seus direitos fundamentais enquanto estas elites gozam imensos privilégios, egoístas e insensíveis, mutilados na melhor parte de sua humanidade, sem solidariedade ou senso de justiça.

sexta-feira, 31 de julho de 2009


A frase é de Jean Paul Sartre*, conforme dizia naquela folha de caderno jogada no chão, em forma de bolinha amassada, que eu recolhi pra ler enquanto aguardava numa fila de padaria, em 1982, em Mar Grande, ilha de Itaparica. Uma frase entre muitas outras, a única que marcou e ficou na memória.

Explicando o desenho:

No alto à esquerda, em torno da palavra "loucos", porta fechada, crucificação, enforcamento, cadeia, a fogueira da inquisição, as formas de discriminação, de perseguição em geral impostas aos considerados loucos pelos padrões vigentes, pelos valores superficiais e momentâneos. Aqueles que descobrem, inventam, criam, trazem o novo para a humanidade são repelidos, criminalizados. O astrônomo desvenda o universo, o ciclista se atira no abismo, um mergulhador se aprofunda, o tanque de guerra é o fruto mau da loucura, o navegante de séculos atrás penetra o oceano desconhecido, o caminhante desfruta a solidão das montanhas. Loucura é refletir, nestes tempos de produção e consumo, é voar na imaginação, sempre com o risco de ataque dos predadores medíocres - o homem com a carabina, sobre a letra 's' de 'mais'. No caso exposto, a bruxa é aliada dos loucos voadores, solidária na discriminação e perseguição por conhecer o trato do mundo - sua força anula a intenção do predador. A busca do conhecer, o olho como sol da vida, a música dos loucos encanta a natureza. O louco passa, despido de padrões, preconceitos e valores da sociedade, enquanto esta lhe vira as costas, à esquerda de 'percorridos'. Abaixo, a tristeza olha o mundo a esmagar o louco, que está morto. Só aí os "sábios" - graduados e reconhecidos pelas convenções - se aproximam para estudar as obras da lúcida loucura, terror dos convencionais. A palavra "sábios" está coberta por alguns símbolos sob os quais se abrigam os sábios do mundo, convencionais e numerosos, também, sob os signos acadêmicos, sobretudo nas regiões de cultura ocidental, de origem européia. O quadrinho à direita e abaixo retrata a compulsão dos loucos. O mundo nos impões muros, nos enquadra; os loucos não conseguem ficar enquadrados, pular os muros é inevitável, é isso ou a morte, mesmo em vida. A perda do sentido, o abandono da função, da razão de ser. O quatorze bis é a homenagem ao louco generoso que foi Alberto Santos Dumont, que nunca patenteou nenhum invento seu, e foram muitos, além do avião. Ou aviões, que também foram vários.

* Passei mais de vinte anos dizendo ser Sartre o autor dessa frase. Não é. É de Carlo Dozzi. Mas não importa muito a antena que captou, importa o serviço que ela presta no mundo. Só é bom corrigir o erro.

terça-feira, 28 de julho de 2009

Observar e Absorver



Muitos olham, poucos vêem; muitos falam, poucos dizem;
muitos escutam, poucos ouvem; muitos observam, poucos absorvem.
Nas ilhas, privilégios. E o oceano sem direito.
Em áreas privativas, o mundo parece perfeito.
Tempestade previsível, mas não se quer enxergar,
fugir vai ser impossível, quando a tsunami chegar.
Observar e Absorver - detalhadamente



O estilo psicodélico-lisérgico une o acaso a referências variadas, harmonias e desarmonias, direções, contrastes, construções e destruições, cores e sons, guerra e paz, condicionamentos e libertações, vida, morte e continuação. Ligação entre os índios saqueados, expropriados e destruídos, representados no O de baixo e os palestinos, no E baixo, sofrendo o mesmo processo, com armas mais destrutivas, sob os olhos do mundo inteiro, em plena época de comunicação internética, imediata. A situação cada vez mais clara. É observar e absorver.

O império, os valores impostos e os valores esquecidos


sábado, 20 de junho de 2009

O analfabeto político - Brecht





O fundo do poço





"Há males que vêm para o bem" diz o ditado em português. Prefiro a versão em espanhol, "no hay mal que para bien no venga", não há mal que não venha para o bem. Na minha opinião, todas as dores têm sua função, sua lição a ensinar, sua razão de ser, ainda que não possamos perceber - é isso, depende da nossa capacidade de perceber, de reconhecer erros, de aprender na dor, questionando a nós mesmos. Mas o orgulho nos leva a encontrar culpados, a espalhar responsabilidades, a livrar a nossa própria cara... burrice, reconhecer os próprios erros é o primeiro passo para a melhoria de si mesmo.
Quatro frases se misturam à decoração do desenho, ao entorno do recado principal, com referência ao mesmo tema. A primeira é "há sinais, vê quem é capaz", pois ninguém (ou melhor, quase ninguém) vai ao fundo do poço sem passar por vários sinais de que se está numa roubada, a vida oferece as oportunidade de percebermos e nós as ignoramos, temos a tendência de ver a realidade do jeito que gostaríamos que ela fosse e negar o como ela é. Somos influenciados pelo que nos convém, pelo que desejamos, e não enxergamos a realidade que, quando se impõe (pois a realidade se impõe, cedo ou tarde), nos desequilibra, nos derruba.
A segunda, abaixo e à esquerda, diz "tudo são lições". São oportunidades, a dor é um momento crítico que possibilita criar resistência, abrir a visão, perceber em si e no mundo, coisas que não percebia, antes. O que torna a dor insuportável é não saber o porquê dela, é não entender o que está fazendo tamanho sofrimento em nossa vida. A partir do momento em que se percebe o porquê da dor, ela ameniza, perde o viés insuportável, esclarece e se conforma com o inevitável, abrindo espaço para novas vivências, vai caindo no arquivo.
Mas a dor, por si só, não esclarece, não melhora ninguém. É preciso reconhecer falhas, os próprios erros - ou repetiremos o mesmos erros, várias vezes, mesmo com nuances diferentes -, é preciso localizar suas causas e trabalhar nelas, elas não somem por terem sido percebidas. Por isso, embaixo e à direita, está escrito "a humildade aprende, o orgulho se ofende". O orgulho coloca à frente duas falsas saídas, na verdade becos sem saída, ou sem saída honrosa. Uma é a revolta, a busca de um responsável pela dor, alguém pra "pagar por isso", fonte de discórdias, agravamento da situação. Outra é a depressão, o se fazer de vítima, se sentir injustiçado. É a inação, a preguiça, a postura do "me ajudem".Verdadeira aversão a reconhecer a própria responsabilidade, em ambos os casos. O orgulho emburrece e estaciona a gente.
A quarta frase, e a mais escondida, se deve a eu ter percebido uma freqüência enorme de traição nas situações de fundo de poço. Confia-se em quem se gosta, e a traição é uma punhalada em pleno coração desarmado. Mas, em geral, puxando pela memória, percebe-se que foram dados sinais de caráter, em conversas sem compromisso, em papos eventuais, opiniões, comentários, observações. Tivemos os sinais mas, por afeição, distração, simpatia ou algum outro motivo, relevamos, não os tomamos como sinais. Por isso, escrevi de lado, à direita pouco acima da metade da altura do desenho, numa linha ondulada, "a traição se denuncia antes".
Integração dos povos na América Latina








Precisamos romper as correntes que se renovam geração a geração, desde a chegada dos europeus. Precisamos da conscientização, da união dos povos resultantes com os originários.

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Bandeira

Bandeira




Expectativa






A expectativa indevida é mãe de muitas frustrações. Há expectativas devidas, quando se confia em alguém é justo se esperar lealdade. Mas a maioria das expectativas é indevida. Espera-se que o filho siga uma profissão, que seja desta ou daquela maneira, ou que nunca seja de alguma forma; espera-se disponibilidade, espera-se confiança, espera-se paciência, espera-se conivência, apoio, carinho, espera-se gratidão.
Expectativa gera frustração, que gera sofrimento, que gera mais sofrimento. Se não esperamos, não sofremos tanto. Por que, então, esperamos quando é indevido? Porque somos presos à visão estreita da nossa própria pequeneza. Quando fazemos algo por alguém, por exemplo, o objetivo não precisa ser a gratidão da pessoa, ou mesmo que ela aproveite bem o que fizemos. Se tivermos como objetivo apenas fazer o que nos for possível fazer, estaremos satisfeitos ao fazê-lo, independentemente do proveito ou do reconhecimento. Veremos ali uma pessoa grata ou ingrata, capaz ou incapaz de aproveitar as oportunidades, demonstrando o que é, sem que isso nos fira. Apenas uma lástima.
Além do mais, agir da melhor forma possível sem esperar nenhuma espécie de retorno nos permite não desistir de seguir fazendo, tentando, oferecendo, o que é uma alegria poder fazer, faz até bem à saúde. Decepções acabam nos amargurando, estragando a vida, é preciso evitá-las ou, se não for possível, superá-las. Algumas das melhores pessoas que conheci, recebi em casa como hóspedes, mal as conhecendo. Resolvi não permitir que um ou outro traiçoeiro me fizesse fechar as portas e parar de receber. Estudando bem cada caso de engano, fui aprendendo a distingüir os sinais de caráter, antes de depositar confiança.
Uma vez, quando andava a esmo pelo mundo, fui recebido por uma senhora viúva que morava com filhos, noras, genros e netos, tudo no mesmo terreno, várias casinhas e composições familiares, a maior era a da mãe, que a dividia com dois filhos ainda não casados - haviam sido 18, oito não "vingaram", morreram pequenos, dois morreram grandes. Um morava numa cidade vizinha. Cheguei no pricípio da noite, pedindo pouso na varanda, a velha estava na janela, candeeiro aceso num prego, no alto, expliquei que viajava e só queria dormir pra seguir no dia seguinte, ela mandou entrar, chamou os filhos, perguntou se eu já tinha jantado. Mandou a filha fazer um prato de comida. Fui levado pra dentro, jantei o que havia nas panelas, sobrado do jantar deles. Aos poucos foram chegando os familiares das outras casas e, em pouco tempo,me enchiam de perguntas e respondiam as que eu conseguia fazer. Soube que a mãe ficava na janela todo dia, esperando o filho que "sumiu no mundo", atrás "sabe lá Deus o de que esse menino foi atrás". Todos achavam uma perda de tempo, tentavam convencê-la a abandonar o hábito, achavam que ela ficava sofrendo à toa, mas ela se limitava a responder "ele vai voltar, que eu sei", baixo, olhar no escuro da noite. Quando tinham saído quase todos e a viúva estava tirando o lampião, eu me arrisquei a perguntar - "o que a senhora fica fazendo?" "Rezando, meu fio, pra que ele seje recebido bem, como eu lhe recebo". "E a senhora acha que ele vai voltar nessa hora que a senhora fica na janela?" Ela me olhou condescendente, sorriu. "Essa é a hora que eu dei pra ele, de todo meu dia. Deus é que sabe se ele volta, mas eu tenho que esperar aqui, todo dia". E acrescentou, quase como para si mesma, "é o jeito d'eu tá com ele, senão morria de sofrer". Aí eu entendi, senti a grandeza daquela espera, mística, interna, pacificadora. Essa mãe coloquei no alto do desenho.

observar e absorver

Aqui procuramos causar reflexão.