domingo, 2 de outubro de 2022

Eleições de 22 - ponto de passagem, não de chegada.

 Não estou impregnado desse clima de festa, dessa "alegria da vitória", não me sinto "feliz de novo", não participo de comemorações, nem vejo a luz no fim do túnel. Só estou vendo as trevas espessas que cobriram o aparato estatal se dispersando, pouco a pouco. As revelações foram feitas, a maldade escondida tomou coragem de se mostrar, a perversidade se assumiu perversa, covarde, indiferente a injustiças e sofrimentos alheios. Os cargos públicos nunca se mostraram tão claramente vendidos, movidos a montanhas de dinheiro público, em plena pandemia, em pleno processo de empobrecimento e desemprego, em meio à fome e o desabrigo crescentes. É preciso dar proveito a essas revelações.

O que espero é o restabelecimento das instituições, pra recomeçar a tentar colocá-las no verdadeiro serviço público, no cumprimento da Constituição, no atendimento pleno de todos os direitos da população. Em todo esse período desde 2016, o que se viu foi o desmonte de várias estruturas industriais, de um sem número de programas que atendiam, ainda que mal e pouco, direitos básicos, humanos e constitucionais da maioria historicamente roubada nesses direitos. As instituições foram ocupadas pela bandidagem e foram invertidos os seus procedimentos. Protestar ou denunciar ficou mais perigoso do que sempre foi. A impunidade foi instalada, o incentivo aos crimes, maior que nunca.
Volta à cena o velho teatro de marionetes. Agora mais visíveis as forças econômicas tenebrosas que ainda dominam as câmaras - de vereadores, deputados tanto estaduais quanto federais e senadores -, os governos municipais, estaduais e federal, o judiciário por vias tortas e as comunicações, dominando todas as mídias e capturando a audiência da massa da população, em todas as suas formas. É preciso levar em conta que política não é só partidária. Política é muito mais que isso. Vem de polis, vários, muitos, e trata da existência coletiva buscando harmonia social. Tratar de entender como funciona a estrutura social, como funciona uma prefeitura e suas secretarias, o país e seus ministérios, como são compostos os orçamentos, de onde vêm e como são aplicados, em que setores e por quê, isso é tratar de política. E deveria ser ensinado nas escolas, desde os primeiros anos, adaptados, claro, ao linguajar e à realidade de cada fase do desenvolvimento.

É preciso criar espaços de encontros coletivos, pra falar sobre as necessidades do coletivo, pra resolver problemas e apresentar aos "poderes públicos" o que precisa ser resolvido, ainda que no passo a passo. Conhecer as formas de pressionar o atendimento dos direitos, contar com uma imprensa honesta, que não venda sua consciência - as empresariais priorizam interesses econômicos, não a verdade. É preciso também abrir espaço pras comunicações, geral, desde as comunidades periféricas às escolas, associações, sindicatos, universidades, enfim, detonar o domínio empresarial sobre o espaço das comunicações no país.
 
O controle dos territórios, as decisões finais sobre o que acontece neles devem ser dos que vivem nesses territórios. A sabedoria periférica, de sobrevivência e superação dos que formam o alicerce da sociedade, deve se impor em condições de igualdade aos saberes restritos a poucos e, em  sua maioria induzidos a um sentimento de superioridade ilusório e intencionado na criação de barreiras e afastamento entre o saber e a sabedoria. 

Este é o grande temor da classe dominante, que o saber e a sabedoria se unam na busca de uma sociedade menos injusta, mais igualitária, menos perversa e mais solidária. Pra manter as coisas como são, é preciso ignorância e desinformação, consumismo e alienação, competições e disputas, miséria e exploração. É preciso espalhar o saber, sem restrições e com humildade. E a humildade, por sua vez, é o melhor veículo pra aquisição de sabedoria. 
A necessidade da aproximação requer, do saber, respeito, humildade e disposição de aprender. E da sabedoria, consciência das próprias capacidades, auto-estima e respeito próprio. 

6 comentários:

  1. Tão bom ver alguém com pensamento sensato, tõa bom ver uma escrita humana em meio a esse caos e barbárie. Obrigado Eduardo.

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  3. Sou sua fa. Seus pensamentos me enriquem e edificam minha consciencia. Faco perguntas igual a voce. Tenho espiritualidade e nao religiao.

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  4. Como é difícil assistir a esse desmonte sem ter muito o que fazer... Ainda temos um voto cada, né...? E ainda podemos continuar com nosso trabalho de formiguinha, que muitas vezes parece ter pouco impacto, mas é ao que me agarro todos os dias pra buscar energia pra persistir. Sempre. Não deixar se abater, não deixar se corroer e se envenenar pela perverso. Escolher o caminho do trabalho e da paz. Da busca dessa serenidade... Nunca foi fácil e continua bem difícil, mas não aceito outro pra paz e pro equilíbrio que busco diariamente. Somos essa sociedade de base que ainda continua como um elefante amarrado ao pé de uma uma cadeira... Somos todos peças desse xadrez que ao fim da vida voltamos todos pra mesma caixa. Mas a ficha ainda não caiu pra muita gente. Me dói os ouvidos escutar um jovem dizer que "quer ser alguém na vida". Sempre que tenho a oportunidade digo de volta "Você já é alguém na vida. Todos somos!" . É preciso mesmo resgatar essa auto-estima e esse respeito há tanto tempo perdida... Na verdade acho que na história desse país ela nunca existiu para essa classe que carrega a nossa sociedade nas costas. Sigamos trabalhando nos nossos micro núcleos pra tentar resgatar o valor do humano e sua dignidade. Vamos nos reabastecendo uns nos outros. Qualquer progresso pelo menos ainda será algum progresso. Essa é a batalha que conseguimos lutar. E precisa ser uma batalha rotineira.

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    1. E ainda quem traga pouco alivio a sociedade, trás sempre paz na consciência. É pela paz que eu quero seguir.

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  5. Definitivamente vc, pra mim, é um chamamento à reflexão! Obrigada por compartilhar suas experiências conosco.

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